Societário

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  • Planejamento patrimonial e reforma tributária

    Planejamento patrimonial e reforma tributária

    Sensível a todos que empreendem, o atual sistema tributário brasileiro tem enfrentado diversas críticas desde sua instituição, com a promulgação da Constituição Federal de 1988, que, muito embora tenha trazido importantes avanços relativos à descentralização de receitas com relação à União, Estados e Municípios, contribuindo com a redução de desequilíbrios regionais, se mostrou excessivamente complexo, burocrático, ineficiente no que diz respeito à concentração de renda e demasiadamente oneroso.

    Neste cenário, tornou-se comum discussões sobre planejamento tributário e patrimonial, mecanismo pelo qual, utilizando-se de ferramentas lícitas (elisão fiscal), o contribuinte busca reduzir sua carga tributária em sua atividade produtiva, bem como em suas operações pessoais e na organização de seu patrimônio, até mesmo para viabilizar uma sucessão mais tranquila e menos onerosa aos herdeiros.

    Sob a ótica do planejamento patrimonial, sempre estiveram em evidência o Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis – ITBI e o Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doação – ITCMD, o primeiro, de competência dos municípios, o último, de competência dos estados.

    Isso porque, quando se pensa em transferência onerosa de patrimônio imobiliário, fala-se, invariavelmente, em ITBI, com recente discussão sobre a incidência do referido tributo em operações de integralização de bens imóveis para constituição de sociedades sem preponderância de atividade imobiliária, nos casos em que há divergência entre o valor declarado na integralização e o valor venal considerado pelo município.

    Já quando se pensa na transmissão gratuita de bens, como a doação de bens de pai para filhos ou netos, ou em casos de falecimento, há a incidência do ITCMD.

    Oportuna, portanto, a análise da incidência dos referidos tributos nas operações de planejamento patrimonial e sucessório sob a luz das mudanças previstas no texto da PEC 45/2019, que propõe a reforma tributária.

    Quanto ao ITCMD, atualmente, além de uma faixa de isenção, vigora uma alíquota única, fixada pelos estados, independentemente do valor do bem. Em outras palavras, em caso de doação ou herança, sendo o bem objeto a ser transmitido avaliado em R$100.000,00 ou R$1.000.000,00, o cálculo do imposto devido será realizado por meio de utilização de uma mesma alíquota, com exceção de estados como Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, no qual já existe progressividade de alíquotas.

    Com a nova regra trazida pela PEC 45/2019, haverá uma progressividade na fixação de alíquotas do ITCMD, de modo que, quanto maior o valor do patrimônio doado ou herdado, maior será a alíquota do imposto incidente na transmissão dos bens (art. 155, §1º, VI – PEC).

    Com relação à competência para exigência do tributo, esta deixa de ser no local onde se processa o inventário ou no foro de situação do bem, no caso de doação, passando para o local de residência do doador ou do falecido.

    Outro ponto de mudança no ITCMD consiste no início de sua incidência sobre heranças no exterior. Neste caso, se o falecido deixar como herança bens no exterior, o imposto será devido no estado de residência do falecido. Caso o falecido more no exterior, o imposto será devido no estado no qual reside o herdeiro.

    Vale dizer que a cobrança do ITCMD sobre herança de bens no exterior não é bem uma novidade, na medida em que já guarda previsão no artigo 155, §º, III, da Constituição, todavia, não chegou a ser posta em prática em razão da ausência de lei complementar regulamentando a matéria, tal qual exigido pelo texto constitucional.

    Muito embora ainda não tenham sido fixadas as alíquotas e faixas de progressividade do ITCMD, o que nos impede, neste momento, de aferir com precisão o impacto tributário da reforma em tais operações, fato é que, com o objetivo de se atingir uma tributação mais ajustada à capacidade contributiva de cada cidadão, a tendencia é a manutenção (ou até mesmo uma leve redução) nas alíquotas do ITCMD incidentes sobre heranças cujo valor se encontrará na primeira faixa de tributação (bens de menor valor) e um aumento progressivo na alíquota do referido tributo sobre heranças de valores mais expressivos, seguindo o exemplo de outros países do mundo, nos quais, após uma primeira faixa de isenção, há progressividade nas alíquotas até o atingimento de um limite máximo, que no Chile é de 20%, na Espanha 34%, na França 45%, nos Estados Unidos 40%, Alemanha 50%, e na Bélgica o exorbitante percentual máximo de 80%.

    Com relação ao ITBI, um tributo cuja incidência em operações envolvendo a integralização de bens imóveis no capital social de pessoas jurídicas tem ganhado destaque no judiciário em decorrência da diversidade de interpretações do Tema 796 do Supremo Tribunal Federal e do Tema 1113, do Superior Tribunal de Justiça.

    Há de se destacar que, muito embora o artigo 148 do Código Tributário Nacional traga uma presunção de veracidade do valor do bem declarado pelo contribuindo no momento de sua transmissão, o qual somente poderia ser afastado mediante regular procedimento administrativo de iniciativa do ente tributante, a prática tem demonstrado que os municípios têm adotado como base de cálculo do tributo não o valor declarado pelo contribuinte na operação, mas sim o valor venal para fins de IPTU, daí porque as mudanças nas regras de tributação deste imposto, trazidas pela reforma tributária, também podem impactar os planejamentos patrimoniais.

    Com a reforma tributária, a atualização do valor venal dos imóveis pela municipalidade é simplificada, podendo ocorrer por meio de decreto municipal (art. 156, §1º, III – PEC), dispensando a necessidade de edição de lei para este fim.

    Neste cenário, imóveis com valorização significativa devem ser alvo de revisão de valores. Considerando o valor venal para fins de IPTU como base de cálculo para cobrança do ITBI, como têm feito os municípios, pode-se concluir que o valor do ITBI também será afetado, sendo possível a majoração do valor do tributo em decorrência do aumento/correção do valor de sua base de cálculo.

    Seja diretamente, como no caso do ITCMD, com possível majoração das alíquotas aplicáveis àqueles de maior poder aquisitivo, seja indiretamente, como no caso do ITBI, com reajuste do valor considerado na base de cálculo do tributo, fato é que a reforma tributária irá movimentar o cenário no qual se inserem os planejamentos patrimoniais.

    A vigência destas alterações, em específico, se dará com a publicação do texto da emenda constitucional relativa à reforma (PEC 45/2019), ou após o prazo de vacacio legis – uma espécie de “carência” – eventualmente prevista.

    Aprovado na Câmara dos Deputados na madrugada de 7 de julho de 2023, o PEC 45/2019 segue para análise e votação no Senado Federal, que está prevista para ocorrer até novembro de 2023. Havendo modificações no seu texto, a proposta voltará à análise da Câmara na parte alterada. O texto integral seguirá para promulgação após aprovação em ambas as casas.

    É por isso, que mais uma vez o planejamento patrimonial se mostra importante e necessário, como forma de melhor acomodar os interesses pessoais dos proprietários, e neste cenário de mudanças, permitirá que seja realizado de maneira menos custosa, sob o aspecto tributário.

  • papel na mesa com martelo juridico e casa

    Impenhorabilidade do bem de família integralizado a uma holding patrimonial à luz do entendimento do STJ

    A holdings patrimoniais são pessoas jurídicas constituídas em sua maioria com a finalidade de facilitar a administração do patrimônio imobiliário de uma pessoa ou grupo de pessoas, já visando também o planejamento sucessório das famílias que possuem diversos imóveis e demais bens, a partir do estabelecimento de regras de gestão e utilização desses bens. Dentre as principais vantagens para a criação de uma holding patrimonial, destacam-se a melhor administração do patrimônio, o aumento da proteção dos bens em casos de casamento e divórcio, aprimoramento do planejamento sucessório e vantagens tributárias, entre outras.

     

    Em razão do aumento expressivo e constante do número de holdings patrimoniais que vêm sendo constituídas no Brasil ao longo dos anos, também vêm crescendo a discussões sobre sua natureza e a forma de lidar com os bens inseridos nesse tipo de sociedade. Dentre os debates travados, verifica-se a discussão sobre a penhorabilidade do bem de família pertencente às pessoas jurídicas, como o caso do imóvel utilizado como moradia por familiares e integralizado por um desses em uma holding patrimonial, que tem como sócios justamente os próprios familiares que residem em tal imóvel.

     

    No Brasil, é considerado bem de família o imóvel que serve de residência à entidade familiar, sendo protegido legalmente pelo Código Civil e pela Lei nº 8.009, que dispõe sobre a impenhorabilidade do imóvel destinado a esse fim. Desse modo, o artigo 1º da Lei 8.009/90 prevê que o imóvel considerado como bem de família, que goza de proteção extra, não pode responder por nenhum tipo de dívida, em atenção ao direito social à moradia, previsto no artigo 6º, caput, da Constituição Federal de 1988, à proteção do patrimônio mínimo do devedor e impedindo o credor de levar o devedor à miséria, privilegiando o princípio da dignidade da pessoa humana.

     

    Ademais, segundo o art. 5º da referida Lei, para os efeitos da impenhorabilidade, considera-se como residência um único imóvel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia permanente.

     

    Por conta das inúmeras previsões legais e dificuldades que permeiam o assunto, em recente decisão, o Superior Tribunal de Justiça julgou o Recurso Especial nº 1.514.567/SP, no qual se discute a possibilidade de invocação da proteção ao bem de família, quando se trata de imóvel de pessoa jurídica. No caso concreto analisado, houve a desconsideração da personalidade jurídica de sociedade familiar, cujas cotas inteiramente pertenciam aos únicos devedores que residem em imóvel integralizado na sociedade, em função da confusão patrimonial entre a pessoa jurídica e seus sócios, hipótese prevista no §2º, art. 50 do Código Civil.

     

    Assim, durante a fase de cumprimento de sentença se constatou que os bens pertencentes aos devedores se limitavam à integralidade das quotas sociais de uma holding patrimonial. Por essa razão, a credora requereu a penhora e avaliação patrimonial das quotas da referida sociedade.   O pedido de penhora foi deferido pelo Juízo, havendo a realização e o registro da penhora, que foi impugnada pelos devedores, a partir do fundamento da impenhorabilidade em razão do fato de que o único ativo da sociedade se tratava de um imóvel no qual os devedores e sua família residiam há 20 (vinte) anos. Ademais, argumentou-se que o imóvel não pertencia às pessoas físicas e sim à pessoa jurídica. Por conta disso, sobreveio decisão determinando a impossibilidade da aplicação da impenhorabilidade do bem de família a partir da Lei 8.009/90.

     

    Remetida a questão ao Superior Tribunal de Justiça, por meio do Recurso Especial de nº 1.514.567/SP, retomou-se o seguinte entendimento “a impenhorabilidade da Lei nº 8.009/90, ainda que tenha como destinatários as pessoas físicas, merece ser aplicada a certas pessoas jurídicas, às firmas individuais, às pequenas empresas com conotação familiar, por exemplo, por haver identidade de patrimônios.” (FACHIN, Luiz Edson. “Estatuto Jurídico do Patrimônio Mínimo”, Rio de Janeiro, Renovar, 2001, p. 154).

     

    Referida decisão do STJ se deu sob o argumento de que é necessário analisar a demonstração da boa-fé do sócio morador que tem o imóvel como sua residência desde antes do vencimento da dívida, circunstância que deve ser avaliada no caso concreto. Por conta disso, o recurso especial foi provido, determinando-se o retorno dos autos à origem, onde será analisada a prova dos autos a respeito da alegação de residência no imóvel dos sócios da empresa devedora.

     

    Portanto, caso, nos autos de origem, seja provado que o imóvel é o de residência da família, será aplicável ao imóvel registrado em nome da pessoa jurídica a proteção da Lei 8.009/90, pois o STJ firmou entendimento de que é “inviável a penhora do único imóvel onde reside a família do sócio, ainda que o bem se encontre em nome da pessoa jurídica, considerado o fato de a sociedade empresária ser eminentemente uma estrutura familiar, como sucede na espécie.”

  • três mãos se tocando encima de uma mesa

    Política Integrada de Governança e Responsabilidade Socioambiental (ESG) da ANS: o ESG enquanto pauta regulatória

    Em 21 de março de 2023, a ANS publicou a Resolução Administrativa nº 82/2023, dispondo a respeito da Política Integrada de Governança e Responsabilidade Socioambiental (ESG) que deverá nortear as relações estabelecidas entre a ANS e suas partes envolvidas.

     

    A Resolução, em seu artigo 5º, II, indica como um dos objetivos desta política a adoção de um sistema de comunicação eficiente, visando disseminar os conceitos de governança e de sustentabilidade a todas as partes envolvidas, com a possibilidade de publicação de guias, manuais e outros instrumentos que busquem direcionar a adoção de boas práticas que integrem as perspectivas.

     

    Dessa forma, é de suma importância que as operadoras de plano de saúde estejam alinhadas com as diretrizes e o planejamento do próprio órgão regulador, ainda que não haja, por ora, nenhuma obrigatoriedade de implementação ou observância das diretrizes e objetivos que serão adotados pela própria ANS em suas relações internas e com as partes envolvidas.

     

    Para além disso, é importante que as operadoras se alinhem não apenas ao projeto regulatório envolvendo à temática ESG, mediante o fortalecimento das estruturas de governança, mas também mediante a inclusão da pauta social e ambiental nos programas e integridade e compliance enquanto exigências de mercado, cada vez mais atento ao cumprimento normativo e à adoção de pautas inclusivas e ambientais.

     

    Já pensou em como é possível atualizar ou implementar o seu programa de compliance à pauta ESG? Para isso é bastante importante contar com o auxílio de uma assessoria jurídica especializada e experiente no tema, para que a construção do seu programa seja sólidao e sustentável.

  • aperto de mao

    Governança Cooperativa: desafios e importância

     

    As cooperativas são sociedades de pessoas estruturadas sobre a pedra fundamental do solidarismo em que prevalece a dimensão humana do trabalho e a supressão do capital como forma de atribuir ao cooperado dignidade, incrementando-lhe a renda, promovendo inserção social e formação cultural. O cooperativismo moderno é um ramo importante para a economia brasileira, movimentando cifras elevadas, seja no ramo de crédito, de saúde ou agrícola, que somam mais de 18 milhões de cooperados em mais de 4 mil cooperativas registradas na OCB.

     

    Tão robusto sistema, de tamanha importância para a economia nacional (movimentando ativos totais superiores a R$ 784 bilhões) necessita, para que se sustente de forma segura, estável e longeva, de estruturas de governança sólidas, que valorizem o cooperado e sua atividade, aproximem-no da gestão do negócio comum e promovam, internamente, a cultura cooperativista, seus princípios e valores, para perpetuar a atividade social, agregando valor a todos os cooperados e não cooperados que dependem da cooperativa. Isso é a Governança Cooperativa.

     

    A Governança Cooperativa[1] consiste em uma série de práticas de direção cuja finalidade é garantir a consecução dos objetivos sociais de forma ética, eficiente e sustentável, com enfoque nas particularidades e princípios do cooperativismo, pautando-se pela autogestão das cooperativas, senso de justiça, transparência, educação e sustentabilidade.

     

    Na implantação de uma política de governança, todos são alvos e parte ao mesmo tempo, desde o estrato mais individual até o mais amplo. O propósito da estruturação da governança cooperativa é estruturar sistemas seguros de controle dos atos de gestão, internamente, seja pelas estruturas sociais internas (órgãos de gestão e fiscalização), seja mediante a aproximação dos cooperados da gestão, participando-os das decisões assembleares, realizando reuniões prévias das assembleias e formação grupos de debates com cooperados, para a captação e desenvolvimento de ideias pelos órgãos gestores, permitindo que o cooperado participe e assista o processo decisório da cooperativa, e se sinta cada vez mais incluído e engajado com o negócio comum.

     

    Isso, em conjunto com uma divulgação mais forte da convocação das assembleias, permite e estimula os cooperados a participarem mais das Assembleias Gerais, sendo uma solução para a baixa adesão ou pouca representatividade, problemática recorrente em muitas cooperativas, que não raro encontram uma tímida participação de seus associados.

     

    Em relação ao Conselho de Administração ou Diretoria, tendo em vista a complexidade das atribuições, consistentes no planejamento estratégico e no gerenciamento da cooperativa, o juízo de qualificação de seus representantes deve ser rigoroso. Assim, recomenda-se o uso de critérios como a exigência de certificação reconhecida pela OCB. Decorrência natural dessa maior responsabilidade dos cargos, o Estatuto deve sistematizar suas atribuições, delimitar competências e alçadas, prever quóruns e forma de substituição de conselheiros, bem como os requisitos mínimos para que possam se candidatar aos cargos de gestão. Além disso, a avaliação de seus membros, em especial daqueles de maior poder e responsabilidade, pelos demais órgãos é medida necessária para preservar o equilíbrio entre os órgão sociais e robustecer os mecanismos de controle, agregando os Conselhos Técnico e Fiscal à estrutura de suporte, controle e fiscalização dos atos da gestão, no que lhes couber.

     

    Quanto a esses órgãos, a transparência é de suma importância, uma vez que suas deliberações têm grande impacto na cooperativa como um todo, sendo recomendável a realização de algumas reuniões abertas aos cooperados de algumas reuniões do Conselho de Administração, bem como da organização de uma boa comunicação interna, entre a gestão e o corpo de cooperados, como forma continuada de prestação de contas, o que pode se dar pela publicação periódica de relatórios, que tragam descrição minuciosa das atividades da gestão.

     

    O Conselho Fiscal, por sua vez, é o órgão de fiscalização da gestão, obrigatório e de funcionamento permanente em todas as cooperativas, pauta-se pela fiscalização assídua e minuciosa dos atos de gestão, com enfoque na regularidade e legalidade das demonstrações contábeis e operações realizadas pela cooperativa, sendo fundamental para a identificação e reação a más práticas de gestão, cabendo-lhe a elaboração de parecer sobre as contas da administração que será levado à apreciação do corpo de cooperados na Assembleia Geral Ordinária, sendo os olhos e ouvidos do corpo de cooperados junto aos órgãos de gestão, cujas competências e limites devem ser estabelecidos no Estatuto Social e no Regimento Interno de funcionamento do Conselho Fiscal, que vinculará a conduta dos Conselheiros Fiscais, bem como a responsabilidade decorrente do exercício de suas funções.

     

    Existe, ainda, toda uma ampla gama de órgãos e comitês importantes para a manutenção e prosperidade da cooperativa e que ficarão de fora do presente artigo, como os comitês de ética, auditoria interna e externa, secretaria de governança, riscos e Compliance, que se coordenam para robustecer, internamente, as estruturas de controle da atividade cooperativa e dos órgãos de gestão, sendo claro que a criação de uma política de governança bem estruturada traz bons frutos.

     

    A estrutura das cooperativas ainda é um mecanismo importante para a geração de empregos, realização organizada de atividades importantíssimas para o desenvolvimento do país, arrecadação de impostos, fomento do mercado e precisa ser sempre aprimorada, como forma de garantir esse tão almejado crescimento.

     

    O modelo de governança cooperativa interessa a todas aquelas cooperativas que querem continuar em posição de vanguarda no mercado, assegurar sua longevidade e agregar valor aos seus negócios, seguindo os princípios da transparência dos seus órgãos gestores, profissionalização da gestão (grande problema pelo fato das cooperativas serem formadas pela união de profissionais de operação de uma determinada atividade que não necessariamente gestores), a interação com o quadro social para estimular a participação (que pode ser facilitado com os meios da tecnologia da informação difundindo informações da cooperativa), e pela organização da atividade de gestão, agregando eficiência à atividade social.

     

    [1] Conceito elaborado pela OCB em seu Manual de Governança Cooperativa: “Trata-se de um modelo de direção estratégica, fundamentado nos valores e princípios cooperativistas, que estabelece práticas éticas visando garantir a consecução dos objetivos sociais e assegurar a gestão da cooperativa de modo sustentável em consonância com os interesses dos cooperados.”

  • Comunicado JUCESP – Transformação de EIRELI para Limitada Unipessoal

    Comunicado JUCESP – Transformação de EIRELI para Limitada Unipessoal

    Em 07/12/2022, a Junta Comercial do Estado de São Paulo (“JUCESP”) divulgou um comunicado informando que, no período entre os dias 09 e 11/12/2022, realizaria automaticamente a transformação de seu banco de dados e da Receita Federal do Brasil de EIRELI (Empresa Individual de Responsabilidade Limitada) para Sociedade Limitada Unipessoal.

     

    Isso porque, como é cediço, com o advento da Lei nº 14.195 de 26 de agosto de 2021, houve a revogação tácita dos artigos 44, inciso VI e 980-A do Código Civil, que previam a existência da EIRELI. Na mesma lei, restou determinado em seu artigo 41 que todas as EIRELI existentes na data de entrada em vigor da lei seriam transformadas em sociedades limitadas unipessoais, independentemente de qualquer alteração em seu quadro constitutivo.

     

    Tal lei está em plena consonância com as mudanças originadas na Lei da Liberdade Econômica (Lei nº 13.784/2019), por meio da qual passou a ser permitida a constituição de sociedade limitada por apenas uma pessoa, afastando de vez a própria razão de ser da EIRELI e substituindo o espaço até então ocupado por esse tipo de sociedade composto por quem empreende de forma individual.

    Nesse sentido, o DREI (Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração) expediu o Ofício Circular SEI nº 3510/2021/ME – utilizado pela JUCESP para embasar seu comunicado – determinando que as Juntas Comerciais:

     

    1. a) Incluíssem na ficha cadastral das EIRELI já constituídas a informação de que foi “transformada automaticamente para sociedade limitada, nos termos do art. 41 da Lei nº 14.195, de 26 de agosto de 2021”;
    2. b) Dessem ampla publicidade sobre a extinção da EIRELI e acerca da possibilidade de constituição da sociedade limitada por apenas uma pessoa, bem como realizem as medidas necessárias à comunicação dos usuários acerca da conversão automática das EIRELI em sociedades limitadas; e
    3. c) Abstivessem-se de arquivar a constituição de novas EIRELI, devendo o usuário solicitante ser informado acerca da extinção dessa espécie de pessoa jurídica no ordenamento jurídico brasileiro e sobre a possibilidade de constituição de sociedade limitada por apenas uma pessoa.

    Diante do exposto e considerando que a conversão automática da EIRELI para Sociedade Limitada Unipessoal se dará somente no cadastro da nova empresa na Junta Comercial, recomenda-se que os titulares de EIRELIs já registradas adaptem seus instrumentos de constituição para alterar a forma da sociedade para a Sociedade Limitada Unipessoal, garantindo, assim, a segurança jurídica, a preservação da identidade e da credibilidade da empresa perante o mercado e já preparando-a para eventual crescimento.

  • aperto de mão entre sócios

    Conflitos e impasses societários: uma anatomia do declínio

    O contrato de sociedade é um casamento que se pretende duradouro e fértil, duradouro porque ao nascer grande parte das sociedades não tem prazo de validade, e fértil porque já nascem com o único objetivo de desenvolver uma atividade econômica organizada e lucrativa.

     

    Nascem, no entanto, de formas diversas, que melhor acomodem o interesse dos sócios, o tipo de negócio que será desempenhado e sua dimensão, devendo pautar-se antes na eficiência da estrutura escolhida e em seu modelo de gestão para se dê o primeiro passo sem entraves ou dificuldades.

     

    A neonata sociedade e os sócios, em seu casamento recém iniciado, seja qual forma tenham adotado (sociedade simples, limitada ou anônima), passarão diariamente pela necessária e inevitável tarefa de administrar o negócio e tomar decisões voltadas para o melhor desenvolvimento da sociedade, tendo como ponto focal o interesse comum dos sócios que será sempre o desenvolvimento lucrativo do negócio.

     

    Em algumas sociedades há de forma clara um sócio controlador que pode exercer sobre os demais sócios, de forma isolada, o poder de impor sua vontade sobre o destino da sociedade nas deliberações sociais e na administração do negócio, cabendo aos sócios minoritários fiscalizar a atividade do controlador e combater o abuso de poder de controle caso controlador abuse de sua posição societária dominante.

     

    Em outras sociedades, no entanto, a posição de controle não é de fato bem definida, havendo sociedades em que não se tem um controlador definido (com mais de 75% o capital social nas sociedades limitadas, ou 50% mais um das ações das sociedades anônimas), havendo ainda as sociedades paritárias (50/50) e sociedades igualitárias em que diversos sócios possuem a mesma participação social, e por fim as sociedades em que não se tem um controlador definido, com mais dispersão do capital entre diversos sócios ou acionistas (aqui não se está a falar sobre capital pulverizado, mas disperso entre alguns sócios, seja a sociedade anônima ou limitada).

     

    Em todo caso, quando não se há um controlador definido, para que a sociedade seja bem sucedida é necessário, antes de tudo, que haja harmonia entre os sócios e que, para que essa harmonia prevaleça, sejam criadas estruturas societárias que a fortaleçam e formas de solução de conflitos e impasses que evitem ou mitiguem o desgaste nas relações societárias.

    Mas como conciliar tantos interesses de forma eficiente?

     

    Em um primeiro momento, é preciso sinalizar a importância de uma base sólida e bem refletida para a sociedade – seu contrato social. É nesse documento em que estão contidas as regras gerais da estruturação da sociedade, os direitos de cada sócio, suas obrigações, as previsões sobre como são tomadas as decisões sociais, como será procedida a dissolução em caso de morte, retirada ou exclusão, como serão distribuídos os lucros aos sócios.

     

    O contrato social é o ponto de partida de toda sociedade, e de suma importância que deve ser elaborado com cautela, considerando quais problemas a sociedade poderá sofrer no futuro para desde logo regulá-los contratualmente, compondo interesses conflitantes e balanceando os direitos patrimoniais e políticos dos sócios.

     

    Quanto mais minucioso e detalhado for o contrato social, mais situações suas previsões abrangem e, em razão disso, mais protegidos estão os sócios e a sociedade caso haja algum conflito a ser dirimido.

     

    Além do contrato social, existem os pactos parassociais ou acordos de sócios, que buscam detalhar, incrementar e personalizar a disciplina mais generalista do contrato. Nesses documentos podem ser previstas uma ampla gama de cláusulas com o objetivo de fornecer saídas mais céleres para eventuais conflitos, além de detalhar em mais minúcias o dia-a-dia da sociedade, da relação entre os sócios e, inclusive, com a possibilidade específica de previsão de cláusulas de solução de conflitos e controvérsias, caso os sócios entrem em dissenso sobre alguma matéria.

     

    Aqui os sócios poderão dispor sobre a forma de tomada de decisões de forma mais confortável, prevendo formas de desempate e de solução de impasses, como a eleição de um terceiro neutro com poder de decidir entre as opções empatadas, ou ainda previsões mais agressivas como são as cláusulas que dispõem sobre a opção de compra ou de venda de participação em casos de empates ou impasses.

     

    No caso de paridade de participações, o aparente equilíbrio proporcionado pela igualdade de quotas entre os sócios pode, na verdade, significar um potencial risco de conflitos alongados. Sabendo que essa nem sempre é a realidade das empresas, existem dispositivos que podem ser previstos em acordos de sócios que destravam esses impasses – as deadlock provisions.

     

    Em todo caso, de maior importância, para se evitar o declínio da sociedade em razão de impasses entre os sócios, é necessário que a sociedade seja estruturada de forma eficiente, a partir da elaboração de documentos completos, que prevejam a ocorrência das mais variadas situações para que sejam evitados conflitos e o desgaste da relação entre os sócios.

     

    A Radiografia das Sociedades Limitadas[1], realizada pela FGV, em 2014, observou que 53,20% das sociedades limitadas não possuem um sócio controlador definido, sendo do total, 44,91% de sociedades paritárias e 8,32% de sociedades com sócios com participações diferentes, revelando que em mais de metade das sociedades limitadas no estado de São Paulo são sociedades limitadas com controle indefinido.

     

    Disso percebe-se a relevância de se pensar, antes no futuro, e planejar-se para quaisquer possíveis e futuros desentendimentos, por melhor que seja a relação entre os sócios. A relação societária é complexa e intensa, e em razão disso, por melhor que seja, desgasta-se silenciosamente e, aos poucos, transforma-se em desavenças ocasionais até que, quando menos se espera, torna-se um conflito homérico.

     

    A anatomia do declínio, pois, não se trata do declínio do negócio social, mas da sociedade em si e da relação entre os sócios, que precisa ser bem regulada para não se desfazer em prejuízo dos investimentos aportados no negócio. É preciso que ambos estejam protegidos e livres para discutirem abertamente, e com amparo na estrutura societária, sobre o futuro do negócio, certos de que grande parte dos conflitos e impasses terão proteção prevista no contrato social ou no acordo de sócios, evitando-se o desgaste desnecessário e a exposição da sociedade.

     

    Em razão disso e pensando nas formas de solução de conflitos e proteção contra impasses que damos início à série de artigos informativos do escritório Brasil Salomão que tratará sobre Conflitos e Impasses Societários. Até a próxima!

     

    [1] MATTOS FILHO, Ary Oswaldo; CHAVENCO, Mauricio; HUBERT, Paulo; VILELA, Renato; RIBEIRO, Victor B. Holloway. Radiografia das Sociedades Limitadas. Núcleo de Estudos em Marcados e Investimentos. Fundação Getúlio Vargas (FGV) Direito. São Paulo (SP). Realizada em 2014.