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  • Conferência debate a inserção de negócios na região Norte de Portugal

    Conferência debate a inserção de negócios na região Norte de Portugal

    No dia 19 de setembro, a cidade de Matosinhos, em Portugal, sediou o “ATLANTIC TALKS: Oportunidades e Desafios no Norte de Portugal”. O debate gratuito trouxe apontamentos sobre como inserir negócios inovadores na região norte do país europeu. Relações entre parceiros e fornecedores, sinergias, networking, contribuições em ter empresas hospedadas na região norte de Portugal foram outros temas abordados.

  • aperto de mão

    Nova lei modifica os quóruns de deliberação nas sociedades limitadas

    Em 22 de setembro de 2022, a Lei nº 14.451/2022 foi publicada trazendo grandes alterações nos quóruns de deliberação das sociedades limitadas. A alteração ocorreu nos artigos 1.061 e 1.076, com os seguintes impactos:

     

      Redação antiga Nova redação
    Artigo 1.061 A designação de administradores não sócios dependerá de aprovação da unanimidade dos sócios, enquanto o capital não estiver integralizado, e de 2/3 (dois terços), no mínimo, após a integralização. Art. 1.061. A designação de administradores não sócios dependerá da aprovação de, no mínimo, 2/3 (dois terços) dos sócios, enquanto o capital não estiver integralizado, e da aprovação de titulares de quotas correspondentes a mais da metade do capital social, após a integralização.
    Artigo 1.076 Art. 1.076.  Ressalvado o disposto no art. 1.061, as deliberações dos sócios serão tomadas:

    I – pelos votos correspondentes, no mínimo, a três quartos do capital social, nos casos previstos nos incisos V e VI do art. 1.071;

    II – pelos votos correspondentes a mais de metade do capital social, nos casos previstos nos incisos II, III, IV e VIII do art. 1.071;

    III – pela maioria de votos dos presentes, nos demais casos previstos na lei ou no contrato, se este não exigir maioria mais elevada.

     

    Art. 1.076 …………………………………………

    I – (revogado);

    II – pelos votos correspondentes a mais da metade do capital social, nos casos previstos nos incisos II, III, IV, V, VI e VIII do caput do art. 1.071 deste Código;

    ……………………………………………………………..

     

     

    Dessa forma, o quórum legal para a nomeação de administrador não sócio ficou reduzido da unanimidade dos sócios, para 2/3 dos sócios, enquanto o capital não estiver integralizado e, após a integralização, reduziu-se o quórum de 2/3 dos sócios para mais da metade do capital social.

     

    Outro grande impacto foi a revogação do quórum legal de 75% do capital social para deliberar as matérias referentes a (i) modificação do capital social e (ii) realização de operações como incorporação, fusão e dissolução da sociedade, ou a cessação do estado de liquidação.

     

    Com isso, o primeiro impacto relevante será que, após a entrada em vigor da nova lei, as sociedades cujo contrato social não dispõe especificamente os quóruns de deliberação para cada matéria os terão reduzidos, na forma da nova redação do artigo 1.076 e de seus incisos.

     

    O privilégio ao princípio majoritário pela nova opção legislativa também causa um impacto imediato nas relações de controle, tendo em vista que anteriormente, nas sociedades limitadas o controlador precisaria possuir, pelo menos, 75% do capital social com direito a voto para decidir isoladamente os rumos da sociedade. Agora, um sócio que anteriormente não possuía quotas bastantes para tanto, mas que possuía mais de 50% do capital votante, agora poderá exercer o poder de controle na sociedade limitada.

     

    Uma das outras consequências disso é a possibilidade de captação de investimentos pelas sociedades limitadas, com oferecimento de participação societária votante, sem necessariamente dispor de seu poder de controle, ou ainda que o faça, poderá manter em sua posse participação mais relevante em comparação com o regramento anterior.

     

    A lei, assim, promoveu uma equiparação ainda maior entre as sociedades limitadas (que já podia ser regida supletivamente pelo regime da Lei 6.404) e as sociedades anônimas, com a vantagem de que as sociedades limitadas ainda possuem uma estrutura menos rígida e mais econômica, com a possibilidade de distribuir desproporcionalmente os lucros, conforme autorização do contrato social ou deliberação dos sócios, o que é vedado para as sociedades anônimas.

     

    Em razão desses impactos, o artigo 4º da lei dispõe que sua entrada em vigor ocorrerá 30 dias após a sua publicação no diário oficial, o que acontecerá em 22 de outubro de 2022, havendo tempo hábil, portanto, para a realização de ajustes e adequação nos contratos sociais seja para a disposição dos quóruns de deliberação nas sociedades limitadas.

  • Preciso cancelar minha viagem. E agora? Quais são os meus direitos?

    Preciso cancelar minha viagem. E agora? Quais são os meus direitos?

    Com a chegada das férias escolares, muitas pessoas aproveitam para viajar, adquirindo passagens aéreas e pacotes turísticos. Mas, e se ocorrer algum imprevisto, e o consumidor tiver que cancelar a sua viagem? Terá que pagar as exorbitantes multas cobradas pelas companhias aéreas e agências de turismo?

    Se a desistência da viagem ocorrer no prazo de até 24 horas, o cancelamento deverá se dar sem qualquer ônus ao consumidor, conforme estabelece o artigo 11 da Resolução nº 400/2016 da ANAC. E se tiver ocorrido alguma cobrança, haverá direito ao reembolso integral.

    É importante observar, entretanto, que esta norma só vale para passagens aéreas adquiridas com antecedência igual ou superior a 7 dias em relação à data de embarque.

    Já no caso de a necessidade de cancelamento surgir após as primeiras 24 horas, o consumidor poderá se valer do artigo 740 do Código Civil, que prevê a possibilidade de rescisão do contrato de transporte antes de iniciada a viagem, sendo-lhe devida a restituição do valor da passagem, desde que feita a comunicação ao transportador em tempo de ser renegociada, retendo-se, a título de multa compensatória, no máximo 5% do valor pago.

    E se a compra da viagem tiver sido efetuada perante uma agência de turismo?

    Se a compra do pacote tiver sido efetuada por telefone ou pela internet, poderá ser invocado o instituto do “direito de arrependimento”, previsto pelo artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor, que possibilita àquele que adquiriu a viagem cancelá-la no prazo de até 7 dias da data da compra, sem que tenha que pagar qualquer valor a título de multa.

    E na hipótese de a desistência ocorrer após este prazo de 7 dias, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial nº 1.580.278–SP, definiu que o percentual máximo de multa a ser cobrada do consumidor em caso de cancelamento de viagem ou pacote turístico será, em regra, de 20% do valor do contrato, quando a desistência ocorrer em menos de 29 dias da data da viagem, ficando condicionada a cobrança de valores superiores à comprovação de efetivos gastos irrecuperáveis pela agência de turismo.

    É importante, portanto, que o consumidor conheça seus direitos e possibilidades, para que, caso tenha que cancelar sua viagem, possa minimizar os prejuízos sofridos.

     

    Gustavo Altino de Resende 

    E-mail: gustavo.resende@brasilsalomao.com.br 

  • Indenização pela perda de tempo útil do consumidor

    Indenização pela perda de tempo útil do consumidor

    Hoje em dia, os consumidores muitas vezes se veem obrigados a perder relevante tempo útil para resolver problemas causados por maus fornecedores de produtos e serviços.

    Assim, aquele tempo que poderia ser destinado ao trabalho, ao lazer ou ao descanso, por diversas vezes acaba tendo que ser direcionado para tratar de questões como cobrança indevida e abusiva de valores, cancelamentos de tv, internet e telefonia de forma complexa e demorada, atendimento a serviços de telemarketing, etc.

    O Superior Tribunal de Justiça, entretanto, em recente decisão (REsp 1737412/SE, de relatoria da Ministra Nancy Andrighi, julgado em 05/02/2019), passou a considerar como dano indenizável o tempo útil perdido pelos consumidores para resolução de problemas decorrentes de falha na prestação de serviços por parte de maus fornecedores. É a chamada “Teoria do Desvio Produtivo do Consumidor”.

    A Ministra relatora esclareceu que o dever de qualidade, segurança, durabilidade e desempenho que é atribuído aos fornecedores de produtos e serviços pelo art. 4º, II, d, do Código de Defesa do Consumidor, tem um conteúdo coletivo implícito, uma função social, relacionada à otimização e ao máximo aproveitamento dos recursos produtivos disponíveis na sociedade, entre eles, o tempo.

    E, no caso concreto, que exemplifica bem a questão, o Superior Tribunal de Justiça entendeu que uma determinada instituição financeira, ao não adequar seu serviço aos padrões de qualidade previstos em lei municipal e federal, impondo à sociedade o desperdício de tempo útil e acarretando violação injusta e intolerável ao interesse social de máximo aproveitamento dos recursos produtivos, cometeu dano moral, passível de indenização.

    Portanto, todo aquele consumidor que desperdice tempo e esforços consideráveis para resolver problemas que deveriam ter sido resolvidos de forma simples (ou que nem deveriam existir), possui direito a ser indenizado, medida esta que exerce um caráter punitivo, e também pedagógico, a fim de que tais condutas abusivas e inadequadas cometidas por maus fornecedores não mais se repitam perante toda a coletividade.

     

    Gustavo Altino de Resende

    E-mail: gustavo.resende@brasilsalomao.com.br

  • Como o Código de Defesa do Consumidor me protege de cláusulas abusivas em tempos de disseminação do coronavírus?

    Como o Código de Defesa do Consumidor me protege de cláusulas abusivas em tempos de disseminação do coronavírus?

     

    É crescente o aumento mundial do número de pessoas infectadas pelo novo coronavírus, situação que tem gerado debates de toda ordem perante os órgãos mundiais de saúde, agentes econômicos, e mais recentemente, perante os órgãos de defesa do consumidor.

    O avanço global da epidemia somado ao receio de uma possível infecção ou a possibilidade de se deparar com eventos cancelados, pontos turísticos fechados e a impossibilidade de regresso ao seu local de origem na data prevista, tem feito com que muitos consumidores solicitem o cancelamento/alteração de sua viagem, iniciando-se, então, as discussões sobre a aplicação do Código de Defesa do Consumidor em razão deste vírus.     

    Apesar de ninguém ser obrigado a se manter vinculado a um contrato ou serviço no mercado de consumo, de acordo com a regra geral, o cancelamento ou modificação de uma obrigação previamente assumida pode gerar a incidência de multa contratual, pois, vigora no nosso ordenamento jurídico um princípio de Direito chamado pacta sunt servanda, que em linguagem simples significa a força obrigatória dos contratos, que devem ser integralmente cumpridos.

    Contudo, a aplicação fria e literal deste princípio, certamente, pode gerar o seguinte questionamento: será que o contratante é obrigado a manter um contrato de transporte aéreo e até correr o risco de ser infectado, caso seu destino tenha casos confirmados da doença, sob pena de ter que arcar com o pagamento de multas com as quais não concorda?   

    Inicialmente, deve-se compreender que a cobrança de multa pelo cancelamento ou remarcação de passagem aérea é admitida pelo nosso ordenamento jurídico, e de acordo com a Resolução Normativa nº 400/2016 da ANAC, o passageiro só estará isento desta penalidade caso solicite a rescisão do contrato no prazo de 24 horas contadas do recebimento do comprovante da passagem aérea, comprada com antecedência mínima de 07 dias em relação à data de embarque. Para os demais casos, inclusive por doença do passageiro, a RN 400/2016 apenas determina que a companhia aérea ofereça ao consumidor, pelo menos, uma opção de passagem em que a multa não ultrapasse 5% do valor total dos serviços de transporte.

    Porém, tem sido comum algumas empresas se utilizarem da prerrogativa de manter o contrato para justificar a cobrança de multas totalmente desproporcionais, mesmo diante desta situação de epidemia global, e é exatamente neste momento que devemos utilizar o Código de Defesa do Consumidor como instrumento de proteção.

    A Lei Consumerista prevê em seu art. 6º que é direito básico do consumidor a proteção de sua vida, saúde e segurança contra qualquer tipo de risco provocado por um produto ou serviço, assim como, a modificação de cláusulas que estabeleçam prestações desproporcionais e que tornem a obrigação assumida excessivamente onerosa.

    A cobrança de multa para o cancelamento de um serviço que corresponda, praticamente, ao valor da compra realizada, é considerada uma prática abusiva e vedada pelo art. 51 do CDC, que determina a anulação da cláusula contratual que coloque o consumidor em desvantagem exagerada.

    Com base nesses fundamentos, visando evitar maiores danos ao consumidor, no início do mês de março/2020, o Ministério Público Federal enviou uma recomendação à ANAC para que expeça um ato normativo assegurando aos consumidores o cancelamento sem ônus de suas passagens, ou, a possibilidade de utilização do bilhete num prazo de 12 meses, situação que apenas reafirma a obrigatoriedade de observação das normas consumeristas pelas empresas aéreas.

    Desta forma, toda vez que ocorrer um fato totalmente imprevisto e superveniente à contratação, que cause uma onerosidade excessiva a uma das partes,  hipótese que se verifica na cobrança desproporcional de multas para o cancelamento de passagens aéreas, o passageiro encontra no Código de Defesa do Consumidor um instrumento eficaz e adequado para a sua proteção.

     

    Larissa Claudino Delarissa

    E-mail: larissa.delarissa@brasilsalomao.com.br

  • PEC 18/2019: reforma da previdência dos servidores do Estado de São Paulo é aprovada

    PEC 18/2019: reforma da previdência dos servidores do Estado de São Paulo é aprovada

    No dia 03/03/2020, foi aprovada a reforma da previdência dos servidores do Estado de São Paulo, cujo objetivo, além de financeiro, é adequar as regras estaduais à reforma federal da Previdência.

    A PEC 18/2019 alterou os requisitos para a aposentadoria do servidor paulista, fixando idade mínima de 65 anos para homens e 62 anos para mulheres (antes, 60 anos para homens e 55 anos para mulheres), com 35 anos e 30 anos de contribuição, respectivamente.

    Para aqueles servidores que ingressaram no serviço público antes da vigência da PEC, mas ainda não completaram os requisitos para a concessão do benefício de aposentadoria, foram criadas duas regras de transição.

    Ademais, com exceção daqueles servidores que ingressaram no serviço público, com vinculação ao Regime Próprio de Previdência Social, até 31 de dezembro de 2003 – aos quais é garantido o direito à integralidade de vencimentos de aposentadoria e paridade -, a sistemática de cálculo do valor dos benefícios previdenciários será similar à aplicada ao Regime Geral de Previdência Social, assim como as cotas do benefício de pensão por morte.

    Ressalta-se, outrossim, que os professores e policiais civis também foram afetados pela PEC 18/2019.

    Outra relevante alteração foi o aumento da alíquota da contribuição previdenciária, a qual será progressiva, variando de 11% a 16%, conforme decidido após votação do Projeto de Lei Complementar nº 80/2019, aprovado na data de 04/03/2020.

    Ressalta-se que a modificação de alíquotas acima mencionada começará a valer 90 dias após a respectiva sanção, sendo possível, outrossim, discutir judicialmente o seu percentual que exceder 14%, em virtude de seu caráter confiscatório, conforme precedente do Supremo Tribunal Federal.

    Os servidores paulistas que já cumpriram os requisitos para se aposentar e optaram por continuar no serviço público, não serão prejudicados, eis que assegurado o direito adquirido.

    Mais uma vez informamos que o nosso escritório se coloca à disposição de nossos clientes para o esclarecimento de quaisquer dúvidas.

     

    BRASIL SALOMÃO E MATTHES ADVOCACIA

    EQUIPE DE DIREITO ADMINISTRATIVO

    Telefone: (16) 3603-4410

    E-mail: direito.administrativo@brasilsalomao.com.br

  • Mesmo Em Casa, Você Não Está Sozinha!

    Mesmo Em Casa, Você Não Está Sozinha!

    Em meio a uma pandemia, um velho problema se intensifica: a violência contra a mulher.

    O isolamento, a quarentena e o distanciamento social são necessários para conter a disseminação do COVID-19. Porém, a casa nem sempre é um lugar seguro para as mulheres, principalmente neste momento em que elas ficarão confinadas, vinte e quatro horas por dia, com seus agressores. Os problemas financeiros, a embriaguez, o estresse, a depressão e tantos outros fatores podem ser gatilhos para atos de violência, seja ela física, moral ou psicológica. 

    Só no Estado do Rio de Janeiro foi registrado um aumento de 50% nos casos de violência doméstica[1] . A mesma situação se repete em outras localidades, como no nosso Município de Ribeirão Preto, no Estado de São Paulo[2] . O alto percentual é ainda mais assustador, quando consideramos que a cada 7 horas uma mulher é vítima de feminicídio no Brasil[3]. 

    Em razão disso, a ONU Mulheres Brasil fez uma série de recomendações ao Poder Público, dentre as quais podemos destacar[4]: 

    – Garantir que as mensagens de saúde pública sejam direcionadas adequadamente às mulheres, incluindo as mais marginalizadas;
    – Desenvolver estratégias de mitigação que visem especificamente o impacto econômico do surto nas mulheres e desenvolver a resiliência delas;
    – Proteger serviços essenciais de saúde para mulheres e meninas, incluindo serviços de saúde sexual e reprodutiva e;
    – Priorizar os serviços de prevenção e resposta à violência de gênero nas comunidades afetadas pelo COVID-19.

    Todos nós devemos adotar medidas de prevenção e combate à violência doméstica.  Por isso, faz-se necessário lembrar alguns serviços públicos que podem salvar vidas, como é o caso do disque denúncia 180 para reportar uma situação de violência contra mulher e disque 100 para os casos de agressões à criança e ao idoso.

    Não obstante o fechamento dos fóruns e a suspensão dos prazos processuais, é assegurado o plantão judiciário para o atendimento e apreciação dos pedidos cautelares, como são a separação de corpos e o afastamento compulsório do lar do agressor (conforme o artigo 4º, inciso II, da Resolução nº 313, de 19 de março de 2020 do Conselho Nacional de Justiça). 

    Além disto, a Lei foi alterada no ano passado, para permitir que os juízes dos Juizados de Violência Doméstica decretem o divórcio (Lei nº 11.340/2006, artigo 14-A), se assim desejar a vítima, bem como para estabelecer a intervenção obrigatória do Ministério Público em todos os processos que envolvam casos de violência contra a mulher (Código de Processo Civil, artigo 698, parágrafo único) e que eles tenham prioridade de tramitação (Código de Processo Civil, artigo 1.048, inciso III).

    Resta lembrar, por fim, que em Ribeirão Preto, o telefone da delegacia da mulher é o (16) 3625-3368.
    Mesmo em casa, você não está sozinha! 

    Daniela Meca Borges – daniela.meca@brasilsalomao.com.br
    Telefone(s): (16) 3603-4400

  • Exclusão do valor “descontado” ou pago pelo trabalhador a título de vale transporte, vale alimentação e seguro saúde das contribuições previdenciárias

    Exclusão do valor “descontado” ou pago pelo trabalhador a título de vale transporte, vale alimentação e seguro saúde das contribuições previdenciárias

    Diante da onerosidade existente na tributação quanto à folha de salários/remuneração, cabe sempre discutir algumas questões que possam reduzi-la.

    A folha de pagamento traz o cálculo do salário bruto dos empregados, que é composto pelo salário líquido acrescido dos descontos permitidos pela legislação do trabalho.

                Dentro do salário bruto vemos descontos de vale transporte, vale alimentação, planos de saúde, medicamentos, entre outros. Tratam-se de valores suportados ou pagos pelos empregados, porém que são descontados do salário bruto mensal para formar o denominado salário líquido.

                Assim se faz a indagação desse estudo, se dentro da base de incidência das contribuições previdenciárias deve ser excluído o montante descontado dos empregados a título de vale transporte, vale alimentação e convênio médico e odontológico, ou seja, se a base de cálculo das contribuições previdenciárias se faz sobre o salário bruto ou o líquido.

                Antes, entretanto, de nos aprofundarmos na discussão, passemos a fixar as premissas básicas.

    As contribuições previdenciárias são contribuições sociais previstas no art. 195, I, “a”, da Constituição Federal, criadas pela União, exigidas do empregador, empresa ou a ela equiparada, tendo como base de incidência a folha de salário e demais rendimentos pagos ou creditados a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício.

    Percebe-se que a incidência de tais contribuições está totalmente relacionada ao pagamento como contraprestação a qualquer título, de forma onerosa, em decorrência ou não de vínculo empregatício entre um empregador ou empresa, mesmo que por equiparação, por força de um serviço prestado.

    Levando em consideração a unidade da Constituição, bem como interpretação sistemática, temos que trazer à discussão o art. 201, § 11, da Constituição Federal que, ao tratar da Previdência Social, estabelece que os ganhos habituais, a qualquer título, serão incorporados ao salário do empregado para fins de contribuição previdenciária.

    Tal dispositivo nos conduz ao entendimento de que, na relação empregatícia, onde o salário é a base de incidência de tais contribuições, há de se incluir também ganhos que não são considerados inicialmente salário, mas que, por serem habituais, compõe a base[1].

                Segundo esta base constitucional, temos a instituição e disciplina das contribuições previdenciárias, especialmente, na Lei n. 8.212/91, que, em seus arts. 20, 22 e 28, sistematicamente, produzem a interpretação de que não é somente o salário a base de incidência das contribuições previdenciárias, mas, também, qualquer outra forma de remuneração a título de retribuição do trabalho, com ou sem vínculo empregatício, inclusive, os ganhos habituais.

    No mesmo sentido, ainda, os arts. 457 e 458, da CLT, determinam que a remuneração do empregado, principal elemento de incidências das contribuições previdenciárias, como regra, determina que salário decorre  (i) – de uma relação de emprego; (ii) – de um pagamento em dinheiro ou “in natura”;(iii) – de pagamento que seja decorrente de uma contraprestação entre o empregador e empregado (prestação de um serviço pessoal, com habitualidade, subordinação) ou; (iv) – do pagamento que seja reconhecido como um ganho (acréscimo) para o empregado.

                Ao relacionar noção celetista de salário ao texto constitucional – art. 195, I e 201, § 4º (atualmente, § 11º), juntamente com a legislação previdenciária (Lei n. 8.212/91), no entanto, possível se reconhecer que não será qualquer pagamento (em dinheiro ou por outros meios) auferido por pessoa física que está sujeito à tributação, especialmente, pelo empregador a título de contribuições previdenciárias sobre a folha de salários.

                Faz-se necessário que se tenha um vínculo empregatício e, mais do que isso, que o pagamento seja fruto de uma contraprestação naquela relação jurídica e que concretize um ganho para o empregado.

                Se o pagamento não possuir nexo causal com a contraprestação do serviço pessoal realizado pelo empregado para o empregador, inexiste tributação.

                Do mesmo modo, se o pagamento não gerar um acréscimo – ganho – ao empregado, tratando-se de mero ressarcimento ou recomposição patrimonial, por sua natureza jurídica indenizatória, também não é possível a configuração de salário – ou mesmo remuneração -, de sorte que não incide a contribuição previdenciária.

                Em síntese: sem contraprestação e ganho, mesmo nas relações de trabalho, não é possível a tributação sobre a folha de salário a título de contribuições previdenciárias.[2][3]

                Esta observação é de grande relevância para o tema em questão, pois partindo de referida premissa, poderemos auferir que as razões jurídicas pelas quais a tributação das contribuições previdenciárias terá como salário de contribuição o montante do valor descontado do empregado a título de vale transporte, vale alimentação e convênio médico ou odontológico.

              A primeira razão para se reconhecer a possibilidade de se levar à tributação somente o salário de contribuição sem o montante descontado a título de vale transporte, vale alimentação e convênio médico/odontológico, decorre, conforme premissas, da própria noção de salário e remuneração.

                Isto porque, como já exposto, para que se tenha a incidência de referidas contribuições, é forçoso identificar alguns requisitos, em especial: (i) – remuneração; (ii) – vínculo de trabalho; (iii) – que esta remuneração seja uma forma de contraprestação pelo trabalho.

                Segundo nossa visão, não podemos reconhecer dentro da base de incidência um valor econômico que, em verdade, não seria remuneração do empregador ao empregado a título de contraprestação pelo trabalho.

                Ao contrário, o que se tem, essencialmente e na prática, é uma contraprestação inversa, onde o empregado assume e paga o ônus financeiro para gozo de certos benefícios, notadamente, vale transporte, vale alimentação e convenio médico.

                Ora, como reconhecer a incidência em tal ocasião, quando a relação jurídica é diversa? Equivale dizer: neste contexto jurídico e fático, quem faz a contraprestação em parte para gozo de determinados benefícios é o empregado! De tal sorte, não se pode afirmar que o empregador realiza o pagamento de uma remuneração em virtude de contraprestação, pois nesta hipótese não há.

    Por sua vez, como segunda razão a fim de não tributar tais hipóteses temos também o fato de que tais “benefícios” possuem, ainda, natureza indenizatória ou estão expressamente reconhecidos pelo art. 28, § 9º, da Lei n. 8.21/91 como situações que não seriam incluídas no salário de contribuição.

    Seguindo tais premissas, de início, analisemos o vale transporte.

                Dentro desta perspectiva entendemos que o transporte, em suas diversas modalidades – vale-transporte, dinheiro ou deslocamento concedido pelo empregador – não pode ser reconhecido como salário, muito menos o montante que é assumido pelo empregado.

                Apesar de, indiretamente, possuir relação com o vínculo empregatício, não representa para o empregado um ganho decorrente do trabalho pessoal que executa em favor do empregador.

                O pagamento deste “benefício”, permitindo o deslocamento entre a residência e o trabalho e vice-versa, seja por meio de um vale-transporte a ser utilizado como pagamento a uma concessionária do serviço público (empresa de transporte), como em dinheiro, ou, ainda, por meio de frota própria ou via contratação de empresas terceirizadas, nada mais se trata do que um mero ressarcimento por um custo incorrido pelo trabalhador.

    Trata-se de pagamento que, inclusive, não irá incorporar a aposentadoria e eventual pensão de seus dependentes. Ponto este relevante também para se reconhecer a natureza de ressarcimento, impedindo, assim, a incidência das contribuições previdenciárias. Isto porque, as contribuições previdenciárias, por força de sua caraterística de referibilidade com a finalidade/destinação, não incidem sobre fato econômico que não se destina ao seu próprio fim (previdência), o que resta clarividente nesta hipótese.                                  

                Não resta dúvida, portanto, de que o transporte de empregados, seja mediante vale-transporte, ticket, dinheiro ou o próprio deslocamento – não configura salário, sobretudo, pelo caráter indenizatório, de tal sorte que se torna indevida a exigência de contribuições previdenciárias sobre a folha de salário e/ou remuneração em tal hipótese.

                Aliás, em análise da incidência das contribuições previdenciárias sobre o vale-transporte com pagamento em pecúnia (dinheiro), o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, por seu pleno, decidiu no sentido de que “6 – A cobrança de contribuição previdenciária sobre o valor pago, em dinheiro, a título de vales-transporte, pelo recorrente aos seus empregados afronta a Constituição, sim, em sua totalidade normativa.”[4]

                O posicionamento do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL sobre a matéria é no sentido de que o transporte concedido pelo empregador ao empregado, independentemente do meio utilizado (vale-transporte, dinheiro ou outros meios como o próprio transporte em si) não configura salário, mesmo aquele denominado de indireto ou “in natura”.

    Isto porque, em consonância com a interpretação do art. 195, I, bem como art. 201, § 11, da Constituição Federal, referido benefício teria a natureza jurídica de ressarcimento ou indenização, não tornando possível reconhecê-lo para fins fiscais/previdenciários como tributável como salário ou ganho.

                Ora, se não configura salário, tendo nítida característica remuneratória, muito menos há de incidir sobre encargo assumido pelo empregado.

                Esta posição está, inclusive, consolidada no CONSELHO ADMINISTRATIVO DE RECURSOS FISCAIS – CARF- por meio da súmula 89: “Não há incidência de contribuição previdenciária sobre o vale ­transporte pago em pecúnia, considerando o caráter indenizatório da verba”.

                Nesse mesmo sentido, ainda, lembramos do art. 28, § 9º, “f”, da Lei n. 8.212/91 que, conjugado com os arts. 1, 2º e 4º das Leis nºs 7.148/85, reconhecem a viabilidade do empregador conceder aos empregados vale-transporte, adquiridos das empresas de transporte público, para suprir despesas com o deslocamento ao trabalho, participando com ajuda de custo equivalente à parcela que exceder a 6% do salário básico, sendo que, nessa hipótese, o mesmo não se configurará salário ou rendimento tributável, além de não incorporar ao FGTS.

                Em tais condições, seja pela própria natureza jurídica do vale transporte, como ainda, por força da legislação, não há incidência quanto ao montante pago pelo empregado para fins de contribuição previdenciária.

                De outro lado, temos ainda o vale alimentação.

                Com relação ao vale alimentação, este também não deixa de ser um instrumento para o trabalho, caracterizando até mesmo uma indenização.

                Independentemente desta afirmação, o art. 28, § 9º, alínea “c”, da Lei n. 8.212/91 preceitua que o mesmo não se configura salário de contribuição. No mesmo sentido, a Lei n. 6.321/76, nos termos do art. 3º, isenta a parcela paga in natura nos programas de alimentação – PAT.

                Bem por isso, não resta dúvida de que os “descontos” ou pagamentos de parte do custo deste benefício pelo empregado não deve compor a base de cálculo para fins de contribuição previdenciária.

                Enfim, chegamos ao valor relativo à assistência prestada por serviço médico ou odontológico por meio de planos de saúde.

                Da mesma forma, o art. 28, § 9º, alínea “q”, da Lei n. 8.212/91, não reconhece como benefício a compor o salário de contribuição “q) o valor relativo à assistência prestada por serviço médico ou odontológico, próprio da empresa ou por ela conveniado, inclusive o reembolso de despesas com medicamentos, óculos, aparelhos ortopédicos, próteses, órteses, despesas médico-hospitalares e outras similares;   (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017)”

                Vale lembrar que, em verdade, o reconhecimento de que planos de saúde não configuram salário utilidade e, assim, não geram tributação previdenciária já tem posição firmada pela própria Administração Tributária, nos termos de Parecer MPS/CJ n. 107/92.

                Sendo assim, a parte que decorre da contraprestação feita pelo empregado quanto ao plano de saúde não integra o salário de contribuição.

               Tais discussões a respeito da não tributação dos valores resultantes de “descontos” do empregado para custeio de vale transporte, vale alimentação e convênio médico, inclusive, foram objeto de recente decisão do TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO, onde a  2ª Turma, pela relatoria do Desembargador COTRIM GUIMARÃES afirma que “I –  Não incide contribuição previdenciária patronal (art. 22, I, da Lei nº 8.212/91) sobre as verbas pagas a título de  vale transporte e vale alimentação.”[5].

    Possível, desta maneira, reconhecer que os “descontos” para custeio dos benefícios vale alimentação, vale transporte e convênio de saúde não integram o salário de contribuição para fins previdenciários.

     

     

    Fábio Pallaretti Calcini

    Advogado sócio de Brasil Salomão e Matthes advocacia. Doutor em Direito do Estado pela PUC/SP. Pós Doutorando em Direito Fiscal – Universidade de Coimbra/PR. Especialista em Tributação Internacional – Universidade de Salamanca/ESP.  Professor da FGV DIREITO/SP, IBET (especialização e Mestrado), INSPER, FADUSP (RP), FAUEL, entre outras. Ex-membro do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF – MF/DF. Diretor Jurídico Adjunto do CIESP. Membro da Comissão Especial de Direito Tributário do Conselho Federal da OAB.

     

    Thiago Strapasson

    Advogado sócio de Brasil Salomão e Matthes advocacia, graduado em direito pela Unesp, em ciências contábeis pela universidade Moura Lacerda e especialista em direito tributário pelo IBET. Professor de cursos de pós-graduação e extensão. Advogado tributarista com atuação no setor consultivo e de revisão fiscal.

     


    [1] A respeito da relação entre os arts. 195, I, “a” e 201, § 11, temos relevante decisão do Supremo Tribunal Federal que entendeu que: “A contribuição social a cargo do empregador incide sobre ganhos habituais do empregado, a qualquer título, quer anteriores, quer posteriores à Emenda Constitucional nº 20/1998 – inteligência dos artigos 195, inciso I, e 201, § 11, da Constituição Federal” (STF, RE 565160, Rel.  Min. MARCO AURÉLIO, Pleno, j. 29/03/2017, AC DJe-186 DIVULG 22-08-2017 PUBLIC 23-08-2017)

    [2] Os requisitos da contraprestação e ganho nas contribuições previdenciárias é entendimento já consolidado na jurisprudência brasileira pelo SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.

    [3] CALCINI, Fabio Pallaretti. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. IMPOSSIBILIDADE DE TRIBUTAÇÃO SOBRE A FOLHA DE SALÁRIO NA HIPÓTESE DE TRANSPORTE DE EMPREGADOS. REVISTA DE DIREITO TRIBUTÁRIO CONTEMPORÂNEO, v. 2, p. 51-71, 2016;  CALCINI, Fábio Pallaretti. CHILO, Fabio. Contribuições previdenciárias e a participação nos lucros e resultados – PLR: a jurisprudência do CARF. Revista de Estudos Tributários. Porto Alegre: Sintese. 2018 v. 21 n. 122 jul./ago. p. 09 e ss.

    [4]STF, RE 478410, Relator(a):  Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 10/03/2010, DJe-086 DIVULG 13-05-2010 PUBLIC 14-05-2010 EMENT VOL-02401-04 PP-00822 RDECTRAB v. 17, n. 192, 2010, p. 145-166)

    [5] – TRF 3ª Região, 2ª Turma,  ApReeNec – APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO – 5005659-83.2018.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal LUIZ PAULO COTRIM GUIMARAES, julgado em 27/11/2019, e – DJF3 Judicial 1 DATA: 02/12/2019).

  • Tributação das exportações e o STF

    Tributação das exportações e o STF

    Em recente julgamento da ADI 4.735/DF e RE 759.244/SP, o Supremo Tribunal Federal, por votação unânime, reconheceu acertadamente que as receitas decorrentes de exportação indireta, via trading ou empresa comercial exportadora, não poderiam ser tributadas quanto às contribuições para a seguridade social e intervenção no domínio econômico, diante de imunidade tributária prevista no art. 149, § 2º, inciso I, da Constituição Federal, em especial, para o caso concreto, aquelas denominadas de genericamente de “Funrural”.

    Houve, assim, a reafirmação do posicionamento daquela Corte no sentido de que as imunidades tributárias são direitos fundamentais dos contribuintes e merecem uma interpretação finalística e não restritiva, a fim de que atinja amplamente seu propósito.

    Mais do que isso, a decisão proferida também demonstra que a interpretação da expressão “receitas decorrentes de exportação”, posta no texto constitucional, é uma imunidade objetiva, de tal maneira que não se busca proteger sujeitos, mas o próprio ato de exportar, uma vez que não se deve “exportar tributos”, sendo um instrumento fundamental a fim de gerar competitividade no mercado internacional dos produtos nacionais a serem destinados direta ou indiretamente ao exterior, além de gerar dividas, renda, desenvolvimento e empregos em nosso país.

    Não deixa, ainda, o Supremo Tribunal Federal, dentro desta perspectiva, de concretizar a livre iniciativa, estimulando a produção nacional, inclusive dos pequenos visando o mercado externo, sobretudo, consagrando a ideia de igualdade material. Acreditamos que, além disso, efetiva o fomento e desenvolvimento, na medida em que utilização de tradings ou empresas comerciais exportadoras viabiliza a todos do cenário nacional buscar o mercado internacional.

    Porém, é preciso lembrar que o julgamento também permitirá não somente o cancelamento de créditos indevidamente cobrados de pessoas jurídicas, entre elas, agroindústrias, nas exportações indiretas, mas, do mesmo modo, de produtores rurais pessoas fisícas, inclusive, quando da venda para cooperativas, a depender da forma como se deram as operações, tendo em vista a necessidade de se tratar de ato ou comercialização destinado à exportação. Por sua vez, para aqueles que recolheram tais tributos, permitirá dentro de prazos legais, a restituição dos valores indevidamente cobrados.

    Neste sentido, não identificamos razões jurídicas para qualquer busca de modulação via embargos de declaração, diante do resultado unânime do julgamento, o qual foi muito bem fundamentado pelos Ministros, em situação de clara inconstitucionalidade, que não deve ser, de modo algum, objeto de benevolência, pois, não há ato mais grave em um Estado Democrático de Direito do que desrespeitar a Constituição.

    A decisão, em verdade, não traz somente tais reflexos de alta relevância para as exportações, em benefício do próprio país, e, portanto, da sociedade em geral, e não do interesse arrecadatório do Fisco, mas, ainda, nos permite avaliar eventual constitucionalidade da PEC paralela 133/2019, recentemente aprovada no Senado, a qual, indevidamente, pretende tributar as receitas de exportação para as contribuições sobre a receita bruta (como é o caso do Funrural), atingindo significativamente setores como do agronegócio,  o qual representa grande parte da geração de renda e da balança comercial.

    O que podemos afirmar, sobretudo, a partir deste recente posicionamento do Supremo Tribunal Federal, por votação unânime pelos Ministros, é que a PEC paralela, 133/2019, ao pretender abolir a imunidade nas receitas de exportações para as contribuições previdenciárias, especialmente, voltadas para o agronegócio, está claramente violando um direito fundamental do contribuinte estabelecido na Constituição da República.

    Partindo das premissas do julgamento proferido, tal imunidade é uma garantia ou direito fundamental do contribuinte, o qual deve respeitado e garantido, de tal sorte que se aplica ao caso o art. 60, § 4º, IV, da Constituição da República, o que denominamos de cláusulas pétreas.

    Como é de conhecimento, uma emenda constitucional não tem força jurídica para alterar o texto a fim de restringir ou propor medidas tendentes à abolição de um direito fundamental. E, como já dito, a imunidade é um direito e garantia fundamental do contribuinte, independentemente de não estar descrito no art. 5º, da Constituição (STF, ADI 939-7/DF).

    Ora, tal projeto de emenda constitucional, portanto, ao excluir a imunidade para as receitas de exportação, tributando-as por meio das  contribuições previdenciárias, como é o caso do denominado “Funrural”, consumando abolição de direito fundamental do contribuinte – imunidade tributária –, nos leva à forçosa conclusão no sentido de que a PEC paralela 133/2019 é inconstitucional, tratando-se uma “emenda constitucional inconstitucional”.

    Não se nega a necessidade da Reforma Previdenciária, todavia, esta há de ser feita cumprindo as determinações constitucionais, uma vez que a Constituição Federal é a base para a consolidação da democracia e a comprovação para os investidores de que em nosso país há segurança jurídica.

     

    Fábio Pallaretti Calcini

    Doutor e Mestre em Direito do Estado pela PUC/SP

    Pós Doutorando em Direito pela Universidade de Coimbra(Por)

    Ex-Membro do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais  – CARF –

    Professor da FGV DIREITO SP e IBET (Mestrado)

    Sócio tributarista Brasil Salomão e Matthes Advocacia

  • IRPJ – Dedução integral do PAT até 4% do IR devido e inclusão no cálculo o adicional de IRPJ (10%)

    IRPJ – Dedução integral do PAT até 4% do IR devido e inclusão no cálculo o adicional de IRPJ (10%)

    Como é de conhecimento, para as pessoas jurídicas sujeitas à tributação pela sistemática do lucro real, são permitidas uma série de deduções, como forma de se atingir o real montante tributável.

              Uma dessas deduções, refere-se ao Programa de Alimentação do Trabalhador – PAT, que foi criado pela Lei n. 6.321/1976, com o intuito de melhoria nas condições nutricionais dos trabalhadores.

              Aliás, este incentivo, em verdade, concretiza propósitos estabelecidos no texto constitucional, quando consagra a dignidade da pessoa humana (art. 1º, CF, como direitos sociais da mais alta relevância, pois preconizam o direito à alimentação (art. 6º, CF). Trata-se, portanto, de um incentivo com fundamento constitucional do mais alto relevo, impondo ao interprete e aplicador da legislação infraconstitucional sobre o tema, uma interpretação finalística, que busque concretizar com máxima eficácia tais direitos fundamentais, impedindo uma a restrição em sua aplicação.

              Junto com a instituição do PAT houve a criação de um “incentivo fiscal”, qual seja, foi permitida o cômputo dessa despesa como operacional e a respectiva dedução dessa parcela do lucro tributável (uma dedução em duplicidade – já que está já seria dedutível o incentivo está na duplicidade).

              Desse modo, precisamos ter como ponto de partida, para as conclusões a que se pretende, um histórico legislativo do PAT e dos seus reflexos (dedução) na apuração do Imposto sobre a Renda.

              Logo, a primeira legislação a ser citada é o artigo 1º e parágrafo primeiro, da Lei n. 6.321/76, abaixo:

    “Art. 1º. As pessoas jurídicas poderão deduzir, do lucro tributável para fins do imposto sobre a renda o dobro das despesas comprovadamente realizadas no período-base, em programas de alimentação do trabalhador, previamente aprovados pelo Ministério do Trabalho na forma em que dispuser o Regulamento desta Lei.”

    § 1º A dedução a que se refere o caput deste artigo não poderá exceder em cada exercício financeiro, isoladamente, a 5% (cinco por cento) e cumulativamente com a dedução de que trata a Lei nº 6.297, de 15 de dezembro de 1975, a 10% (dez por cento) do lucro tributável.

    § 2º As despesas não deduzidas no exercício financeiro correspondente poderão ser transferidas para dedução nos dois exercícios financeiros subsequentes.”

              Não é preciso muito esforço para se denotar que a única limitação, quando da referida instituição, decorre do disposto no parágrafo primeiro, qual seja, cinco por cento se considerado isoladamente o valor destinado ao PAT e/ou 10% do lucro tributável, permitindo, ainda,  a transferência, em caso de não dedução, para o exercício subsequente.

              Posteriormente, com o advento do artigo 5º, da Lei n. 9.532/97, foi estabelecido que a dedução ao PAT não poderia ultrapassar 4% (quatro por cento) do imposto devido em cada período de apuração. Vejamos o dispositivo legal:

    “Art. 5º A dedução do imposto de renda relativa aos incentivos fiscais previstos no art. 1º da Lei nº 6.321, de 14 de abril de 1976, no art. 26 da Lei nº 8.313, de 23 de dezembro de 1991, e no inciso I do art. 4º da Lei nº 8.661, de 1993, não poderá exceder, quando considerados isoladamente, a quatro por cento do imposto de renda devido, observado o disposto no § 4º do art. 3º da Lei nº 9.249, de 1995. (grifos nossos)

              Novamente, em termos legislativos, nenhuma outra restrição foi imposta para a apuração/dedução do PAT junto ao Imposto sobre a Renda.

              Inobstante a previsão legal, houve a edição de ato infralegal, trazendo sensíveis modificações para a apuração do incentivo/dedução do PAT.

              Desse modo, o Decreto nº 05/1991, sob o pretexto de regulamentar a Lei n. 6.321/76, trouxe substanciais modificações na forma de apuração do PAT, nos termos abaixo:

    Art. 1° A pessoa jurídica poderá deduzir, do Imposto de Renda devido, valor equivalente à aplicação da alíquota cabível do Imposto de Renda sobre a soma das despesas de custeio realizadas, no período-base, em Programas de Alimentação do Trabalhador, previamente aprovados pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social – MTPS, nos termos deste regulamento.”

              Sem delongas e de forma objetiva, o malsinado Decreto 05/1991, “transferiu” a apuração do PAT, que legalmente era sobre o lucro tributável e passou a ser sobre o imposto de renda devido. O montante passível de dedução foi modificado de “o dobro das despesas” para o “valor equivalente à aplicação da alíquota cabível do Imposto de Renda sobre a soma das despesas”.                       Na prática, o Decreto nº 5/91 estabelece que a dedução seria feita do IRPJ devido, no valor equivalente a 15% das despesas realizadas a esse título. Ou seja, essa “singela” mudança na forma de se calcular o benefício trazido para as empresas que aderem ao PAT, trouxe, como principal consequência, significativa, indevida e inconstitucional redução do seu alcance.

              Essa conclusão é inarredável, uma vez que se partimos da premissa de que o lucro tributável é reduzido (dedução em dobro da despesa com o PAT), teremos que o IRPJ e a CSLL incidirão sobre uma base menor, porém se se pode deduzir sobre o imposto devido e não abatida sobre o lucro tributável, o benefício não alcança o adicional do Imposto sobre a Renda.

              Nesse sentido é o posicionamento da Secretaria da Receita Federal do Brasil:

    Solução de Consulta nº 6.044 – SRRF06/Disit

    ASSUNTO: IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA JURÍDICA – IRPJ PROGRAMA DE ALIMENTAÇÃO DO TRABALHADOR – PAT. POSSIBILIDADE DE DEDUÇÃO. LIMITE.

    O limite de dedução do PAT, isoladamente, está condicionado apenas ao percentual de 4% do imposto de renda devido estabelecido no art. 5º da Lei nº 9.532, de 1997, devendo, entretanto, o cálculo do incentivo fiscal de dedução do imposto ter como base, sempre, a aplicação do percentual de 15% (alíquota do IR) sobre o total das despesas de custeio com o programa, realizadas no período de apuração, o qual deverá ser confrontado com o limite estabelecido na legislação.

              A discussão, portanto, neste caso concreto diz respeito à clássica aplicação do princípio da legalidade, uma vez que, conforme se vê, o Decreto traz inovação na ordem jurídica limitando o alcance do benefício criado pela Lei  nº 6.371/76, mais especificamente, o benefício de dedução dos valores ao PAT não alcançam o adicional do IRPJ (10%).

              Vê-se, portanto, que a dedução ao PAT, sem as indevidas limitações trazidas pelo Decreto 05/91, possibilita que da apuração do IR se deduza as correspondentes despesas do lucro da empresa, chegando-se ao lucro real, sobre o que deverá ser calculado o adicional.

              E mais, conforme expressamente disciplinado no artigo 1º da Lei 6.321/76, tal valor deverá ser apurado sobre o dobro das despesas com o PAT, uma vez que a redação da Lei 9.532/97 em nada alterou essa possibilidade.

              O Artigo 1º do Decreto 05/1991 traz flagrante ilegalidade e inconstitucionalidade, ao modificar e limitar o alcance trazido pela Lei 6.321/76.

              Pelo princípio da legalidade, os atos infralegais, notadamente, quando inexiste autorização normativa, não podem criar deveres e restrições não estabelecidas em lei, modificar benefícios, tampouco forma de apuração e quantificação de tributos, em detrimento do exercício daquele direito do contribuinte[1].

              Não é por outra razão que o Superior Tribunal de Justiça tem decidido de forma reiterada sobre o tema em favor dos contribuintes por ambas as turmas (1ª e 2ª):

     

    “TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. IMPOSTO DE RENDA. PROGRAMA DE ALIMENTAÇÃO DO TRABALHADOR – PAT. ART. 1o. DA LEI 6.321/1976. FORMA DE CÁLCULO. DEDUÇÃO SOBRE O LUCRO TRIBUTÁVEL DA EMPRESA E NÃO SOBRE O IMPOSTO DE RENDA DEVIDO. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.

    1. Os benefícios instituídos pelas Leis 6.297/75 e 6.321/76 aplicam-se ao adicional do Imposto de Renda da seguinte maneira: deduz-se as correspondentes despesas do lucro da empresa, chegando-se ao lucro real, sobre o qual deverá ser calculado o adicional (REsp. 1.754.668/RS, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 11.3.2019).”[2]

     

    RECURSO INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DO CPC/2015. AGRAVO INTERNO EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. PROGRAMA DE ALIMENTAÇÃO DO TRABALHADOR – PAT. ART. 1º, DA LEI N. 6.321/76. FORMA DE CÁLCULO. DEDUÇÃO SOBRE O LUCRO TRIBUTÁVEL DA EMPRESA E NÃO SOBRE O IMPOSTO DE RENDA DEVIDO, O QUE REFLETE NO CÁLCULO DO ADICIONAL DO IMPOSTO DE RENDA, AFASTANDO A VEDAÇÃO CONSTANTE DO ART. 3º, §4º, DA LEI N. 9.249/95.

    (. . .)

    2. Ocorre que a jurisprudência deste STJ, analisando todos os dispositivos legais pertinentes, está firmada no sentido de que os benefícios instituídos pelas Leis 6.297/75 e 6.321/76 aplicam-se ao adicional do imposto de renda, devendo, primeiramente, proceder-se à dedução sobre o lucro da empresa, resultando no lucro real, sobre o qual deverá ser calculado o adicional. Precedentes: EDcl no AgRg no REsp 940735 / SP, Primeira Turma, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 20.05.2010; REsp 526303 / SP, Segunda Turma, Rel. Min. Castro Meira, julgado em 27.09.2005; AgRg no REsp 115295 / DF, Segunda Turma, Rel. Min. Franciulli Netto, julgado em 02.09.2004.

    3. O caso é que a FAZENDA NACIONAL não compreende, ou insiste em não querer compreender, que a ordem de deduções antecede a aplicação do art. 3º, §4º, da Lei n. 9.249/95. Dito de outra forma, a integralidade do adicional a ser preservada pelo mencionado dispositivo de lei já é formada com as deduções antecedentes sobre o lucro tributável.

    4. Agravo interno não provido.”[3]

               

              Não há dúvida de que o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça é exatamente no sentido de reconhecer a ilegalidade, e, por conseguinte, permitir o amplo gozo do incentivo quanto à dedutibilidade do PAT.

              Havendo, portanto, pacífica jurisprudência a respeito do tema reconhecendo a ilegalidade do Decreto 05/91, no sentido de que o benefício do PAT deve ser calculado com base na Lei 6.321/76 é possível se reconhecer a inconstitucionalidade/ilegalidade do artigo 1º do Decreto 05/1991.

              Ao estabelecer inovação e indevida restrição na apuração do Imposto sobre a renda e seu adicional de 10% por conta do benefício fiscal em razão da adesão ao PAT, viola claramente o artigo 1º da Lei 6.371/76, que impõe aos atos infralegais o respeito à Lei (legalidade).

     

    Fábio Pallaretti Calcini

    Advogado sócio de Brasil Salomão e Matthes advocacia. Mestre e Doutor em Direito do Estado pela PUC/SP. Pós Doutorando em Direito pela Universidade de Coimbra/PR. Professor da FGV DIREITO/SP, IBET (Especialização e Mestrado), FADUSP (RP), FAUEL, entre outras. Ex-membro do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF – MF/DF. Diretor Jurídico Adjunto do CIESP. Membro da Comissão Especial de Direito Tributário do Conselho Federal da OAB. Membro da Comissão de Direto Agrário e Agronegócio da OAB/SP.

     

    Thiago Strapasson

    Advogado sócio de Brasil Salomão e Matthes advocacia, graduado em direito pela Unesp, em ciências contábeis pela universidade Moura Lacerda e especialista em direito tributário pelo IBET. Professor de cursos de pós-graduação e extensão.


    [1]Neste sentido: CALCINI, Fábio Pallaretti. O princípio da legalidade. Rio de Janeiro: LUMEN JURIS, 2016.

    [2] – AgInt no AREsp 647.485/PE, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 13/05/2019, DJe 20/05/2019.

    [3] AgInt no AREsp 1359814/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 12/02/2019, DJe 19/02/2019.