DECISÃO DO STJ: MOTORISTA DE UBER POSSUI VÍNCULO EMPREGATÍCIO COM A EMPRESA DO APLICATIVO?
Alguns dias atrás fomos surpreendidos com notícias veiculados na internet e até em redes sociais com dizeres de que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) teria decidido que motorista de UBER não tem vínculo empregatício com o aplicativo.
Essa notícia, da forma como divulgada, tende a gerar especulações e por vezes conclusões equivocadas, inclusive no âmbito jurídico, o que dirá na comunidade, que não raro apenas faz uma leitura precipitada das manchetes.
De fato, reconhecemos que o título nos leva a concluir que o STJ chancelou que motorista de aplicativo, no caso UBER, não tem vínculo empregatício com a referida empresa do aplicativo.
Porém, devemos alertar que não é bem assim:
Primeiro, entendemos que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) não tem Competência para declarar/reconhecer/afastar vínculo empregatício, eis que referida competência é exclusiva da Justiça do Trabalho (Varas do Trabalho – Tribunal Regional do Trabalho – Tribunal Superior do Trabalho). Esta sim é que tem o poder de declarar se há vínculo empregatício ou não, o que não é o caso que ora estamos comentando, eis que proferida por outro órgão do Poder Judiciário, qual seja, o STJ – Superior Tribunal de Justiça.
Em verdade, o motivo que levou ao STJ proferir a decisão não tem qualquer relação com análise específica de um suposto vínculo empregatício.
O que temos, na verdade, é que o STJ foi provocado para decidir o que chamamos de conflito de competência, que, de forma resumida, ocorre quando dois órgãos do Poder Judiciário entendem que não têm competência sobre determinada ação, e por isso, remetem ao STJ para que este resolva especificamente esse conflito “de competência”.
No caso, um motorista do aplicativo ajuizou uma ação de reparação de danos materiais e morais contra a empresa do aplicativo, sendo que essa ação foi ajuizada na Justiça Comum (Estadual). O juiz desse caso remeteu a referida ação para uma Vara do Trabalho, por considerar-se incompetente.
Não obstante, o juiz do trabalho também se declarou incompetente, e suscitou o que chamamos de conflito de competência, remetendo então ao STJ para que resolva o conflito.
O STJ, então, entendeu que os pedidos contidos na ação ajuizada pelo motorista do aplicativo não diziam respeito a relação de emprego ou relacionadas a verbas trabalhistas, mas tão somente de pedido para reativar a conta do aplicativo (que tinha sido suspensa) e, consequentemente, poder fazer uso e conseguir assim realizar seu serviço.
Por esse motivo decidiu que, tratando-se de ação onde há pedidos que não têm relação com controversa a respeito de vínculo empregatício, nem mesmo relação de trabalho, a competência é da Justiça Comum – Justiça Estadual, e não da Justiça do Trabalho.
Em razão disso, determinou que quem irá decidir o caso específico é a Justiça Comum.
Porém, temos que frisar que essa decisão não entra no mérito da existência ou não de eventual vínculo empregatício entre motorista de aplicativo e a empresa desse aplicativo, e, portanto, não devemos concluir que a questão do vínculo já está decidida.
Muito pelo contrário, entendemos que a referida decisão deixa aberta a questão e claramente remete aos cuidados da Justiça Especializada (Justiça do Trabalho) a exclusiva tarefa de reconhecer/declarar/afastar vínculo empregatício de motoristas de aplicativo com as empresas respectivas.
Recentemente foi vinculada notícia de que o estado da Califórnia, nos Estados Unidos, sancionou uma lei que expressamente reconhece o motorista de aplicativo como empregado, garantindo a este todos os direitos trabalhistas previstos legalmente, fato que deve ser seguido por mais estados daquele país.
No Brasil, já existem algumas decisões oriundas da Justiça do Trabalho que reconheceram expressamente a existência de vínculo empregatício após analisarem o pedido com os elementos fáticos decorrentes da relação entre motorista e empresa do aplicativo.
Fabricio Fleury Curado Trovareli – Advogado