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  • ANÁLISE DO IRDR TEMA 51 DO TJSP E DA LEGALIDADE DA INSCRIÇÃO DO NOME DE DEVEDORES NAS PLATAFORMAS DE NEGOCIAÇÃO DE CRÉDITO DECORRENTE DE DÍVIDAS PRESCRITAS

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    ANÁLISE DO IRDR TEMA 51 DO TJSP E DA LEGALIDADE DA INSCRIÇÃO DO NOME DE DEVEDORES NAS PLATAFORMAS DE NEGOCIAÇÃO DE CRÉDITO DECORRENTE DE DÍVIDAS PRESCRITAS

    O Incidente de Resolução de Demanda Repetitivas regido pelo Tema 51 do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo aborda questões relevantes acerca da cobrança de dívidas prescritas, especialmente quanto a inscrição do nome de devedores na plataforma “Serasa Limpa Nome”, dentre outras similares de negociação de créditos para cobrança de dívidas prescritas, bem como sobre a aplicação ou não do dano moral em virtude de tal manutenção.  

     

    A decisão que originou o tema buscou esclarecer se o prazo de prescrição do débito pode ser ignorado pelos credores ou se a dívida, apesar de prescrita, ainda pode ser cobrada de forma legítima. 

     

    Dessa forma, em 19/09/2023, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo admitiu o incidente de resolução de demandas repetitivas, acarretando a suspensão desses processos.  

     

    Mas, afinal, a inscrição de dívida prescrita em plataforma como Serasa Limpa Nome e similares é lícita?  

     

    Sabe-se que o prazo prescricional para cobrança de dívidas como as de cartão de crédito, empréstimos e financiamentos, é de 5 anos da data do vencimento. Após esse tempo, em tese, a dívida encontra-se prescrita, não podendo ser cobrada judicialmente, ainda que exista inscrição nas plataformas de negociação de débito, como o Serasa. 

     

    Nesse sentido, cumpre mencionar que o Enunciado nº 11 do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo reconheceu a ilicitude da cobrança extrajudicial de dívida prescrita, quando registrada na plataforma “Serasa Limpa Nome” ou similares, entendendo pela configuração do dano moral, se provada a divulgação a terceiros ou alteração no sistema de pontuação de créditos: 

     

    “Enunciado nº 11: A cobrança extrajudicial de dívida prescrita é ilícita. O seu registro na plataforma “Serasa Limpa Nome” ou similares de mesma natureza, por si só, não caracteriza dano moral, exceto provada divulgação a terceiros ou alteração no sistema de pontuação de créditos: score.” 

     

    Em contrapartida, a Relatora Nancy, firma entendimento contrário ao julgar o REsp nº 2.103.726/SP, o qual afirma que “a prescrição da pretensão não implica a obrigação de retirada do nome do devedor da plataforma Serasa Limpa Nome, pois a mera inclusão não configura cobrança”. 

     

    Por conseguinte, discorre que “…o devedor não deixa a categoria dos devedores em razão da prescrição da dívida, motivo pelo qual não há qualquer óbice para a manutenção de seu nome na plataforma…”. 

     

    Ainda tratando do Superior Tribunal de Justiça, importante trazer à baila que esse reforçou a suspensão de todos os casos que afetam diretamente o Incidente de Resolução de Demanda Repetitivas 2130741- 65.2021.8.26.0000/SP, por meio do Tema Repetitivo 1.264, até definir se a dívida prescrita pode ser exigida extrajudicialmente, inclusive com a inscrição do nome do devedor em plataformas de acordo ou de renegociação de débitos. 

     

    Em despacho publicado no Diário de Justiça de 24/06/2024, o Ministro Relator João Otávio de Noronha esclareceu que há determinação de: 

     

    “a) suspensão, sem exceção, de todos os processos que versem sobre a mesma matéria, sejam individuais ou coletivos, em processamento na primeira ou na segunda instância; 

     

    b) suspensão inclusive do processamento dos feitos em que tenha havido a interposição de recurso especial ou de agravo em recurso especial, em tramitação na segunda instância ou no STJ.”

     

    Diante desse cenário, aos credores, torna-se crucial aguardarem confiantes por um julgamento favorável, para que assim, possam seguir inscrevendo o nome do devedor na plataforma “Serasa Limpa Nome”, dentre outras plataformas similares de inscrição de créditos para cobrança de dívidas prescritas. Além disso, um julgamento favorável aos credores não ensejaria a configuração de danos morais, trazendo assim economia empresarial. 

  • CNJ SUSPENDE EFEITOS DE PROVIMENTOS E RESTABELECE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA POR INSTRUMENTO PARTICULAR

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    CNJ SUSPENDE EFEITOS DE PROVIMENTOS E RESTABELECE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA POR INSTRUMENTO PARTICULAR

    No último dia 27 de novembro, o corregedor nacional de Justiça, ministro Mauro Luiz Campbell Marques, concedeu liminar suspendendo os efeitos dos Provimentos nº 172 e nº 175/2024, restabelecendo a validade dos contratos de Alienação Fiduciária firmados por Instrumento Particular para operações fora do Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI) e do Sistema Financeiro Habitacional (SFH).

     

    A medida foi tomada no âmbito do Pedido de Providências nº 0007122-54.2024.2.00.0000, movido pela União Federal após estudos que apontaram o aumento do custo aos adquirentes de imóveis e a desvantagem competitiva para as entidades que não integram o SFI e o SFH, gerando problemas concorrenciais no setor, elevando significativamente os custos das operações de crédito imobiliário, aumentando a burocracia e dificultando as transações.

     

    A decisão do ministro considerou plausível a interpretação mais ampla do artigo 38 da Lei nº 9.514/1997, que permite a formalização de contratos por instrumento particular com efeitos de escritura pública. Para ele, a exigência de formalização da alienação fiduciária por escritura pública, estabelecida pelos Provimentos nº 172/2024, nº 175/2024 e nº 177/2024 não apenas contraria o entendimento amplo da lei, mas também aumenta custos das transações e reduz a competitividade no mercado.

     

    Na decisão, o ministro destacou que a obrigatoriedade de escritura pública em operações realizadas fora do SFI e SFH pode ter graves repercussões econômicas, afetando o acesso ao crédito e desacelerando novos empreendimentos imobiliários. Além disso, observou que a disparidade nos custos das escrituras públicas entre as diferentes regiões do país aumenta significativamente o custo das operações financeiras garantidas por alienação fiduciária, tornando-as ainda mais onerosas para consumidores, especialmente em estados onde os custos cartoriais são mais elevados.

     

    A liminar prorrogou a regularidade dos instrumentos particulares celebrados antes da entrada em vigor do Provimento nº 172/2024 até decisão ulterior e determinou a suspensão de seus efeitos. Além disso, intimou as Corregedorias-Gerais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal a divulgarem a decisão e solicitou ao Colégio Notarial do Brasil que se manifeste no prazo de 15 dias, sugerindo medidas que possam reduzir os efeitos econômicos identificados.

     

    Sem dúvida, a medida fortalece a segurança jurídica e facilita o crédito para os compradores de imóveis, contribuindo para a estabilidade jurídica no mercado imobiliário, com a redução dos custos e simplificação dos processos.

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Brasil Salomão

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  • RESPONSABILIDADE DE EX-SÓCIO QUE ASSINOU CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO COMO DEVEDOR SOLIDÁRIO DEVE SER MANTIDA MESMO APÓS O PRAZO DE DOIS ANOS DE SUA RETIRADA DA SOCIEDADE

    RESPONSABILIDADE DE EX-SÓCIO QUE ASSINOU CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO COMO DEVEDOR SOLIDÁRIO DEVE SER MANTIDA MESMO APÓS O PRAZO DE DOIS ANOS DE SUA RETIRADA DA SOCIEDADE

     

    Como se sabe, nos termos do parágrafo único do artigo 1.033 do Código Civil, o sócio cedente, ou seja, aquele que repassa suas quotas sociais de determinada sociedade, responde solidariamente com o sócio cessionário, que, por sua vez, é aquele que adquire as respectivas quotas, perante a própria sociedade e terceiros, pelas obrigações que tinha como sócio, até dois anos depois de registrada sua retirada no Contrato Social:

     

    Art. 1.003. A cessão total ou parcial de quota, sem a correspondente modificação do contrato social com o consentimento dos demais sócios, não terá eficácia quanto a estes e à sociedade.

    Parágrafo único. Até dois anos depois de averbada a modificação do contrato, responde o cedente solidariamente com o cessionário, perante a sociedade e terceiros, pelas obrigações que tinha como sócio”.

     

    Ocorre que, tal disposição, que tem como finalidade proteger tanto os interesses sociais quanto os interesses de credores da sociedade, evitando-se a retirada fraudulenta do sócio cedente, nos termos do entendimento mais recente do Superior Tribunal de Justiça, não compreende as obrigações de caráter subjetivo do sócio, que são aquelas que emergem da autonomia privada e da livre manifestação – como, por exemplo, a garantia pessoal prestada em título de crédito –, sendo autônomas, portanto, em relação as obrigações advindas da condição de sócio.

     

    Foi com base nessa linha de raciocínio que, no âmbito do Recurso Especial de nº 1.901.918 – PR, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça entendeu que a assinatura de ex-sócio como devedor solidário em Cédula de Crédito Bancário (CCB) acarreta sua responsabilização pelo pagamento da respectiva dívida, e isso mesmo após o prazo de dois anos contado da data em que ele se retirou da sociedade.

     

    Segundo a Relatora do recurso, a Ministra Nancy Andrighi, como a assinatura da Cédula de Crédito Bancário (CCB) é uma obrigação que decorre da manifestação livre de vontade da pessoa, e não da condição de sócio propriamente dita, a responsabilidade pelo pagamento da dívida se sujeita às normas ordinárias da legislação civil que tratam da solidariedade passiva, a citar, os artigos 264, 265 e 275 da legislação civilista.

     

    Em outras palavras, a obrigação assumida pelo ex-sócio, materializada pela assinatura dele como devedor solidário na Cédula de Crédito Bancário (CCB), não se vincula às quotas sociais por ele cedidas, tampouco decorre de estipulação prevista no âmbito do contrato social da sociedade, de modo que, nesse caso, ele responderá solidariamente pela obrigação pessoal e livremente assumida.

     

    Nesse contexto, já deixando o alerta, tanto para sócios de empresas, quanto para qualquer outra pessoa, para que sejam cautelosos e analisem minuciosamente as consequências da assinatura de contrato bancário como devedores solidários da sociedade que integram, cumpre destacar que existem instrumentos jurídicos hábeis para livrar o sócio cedente da dívida garantida pessoalmente quando da sua retirada da empresa, os quais, entretanto, por serem documentos complexos, devem ser elaborados e analisados por especialistas.

     

    Tal possibilidade é respaldada no fato de que, em que pese decorra da livre manifestação, a dívida foi contraída, exclusivamente, em favor da pessoa jurídica, que não deve, portanto, continuar se beneficiando da garantia pessoal assumida por pessoa que não possui mais relação com a sociedade, devendo esta, por meio de documentos e cláusulas especificas, responsabilizar-se pela retirada/substituição do ex-sócio do contrato que originou a dívida, sendo fundamental a assessoria jurídica por parte de advogado de confiança e especialista no assunto.

     

    Fábio Santos Pimenta

     

    E-mail: fabio.pimenta@brasilsalomao.com.br

    Telefone: (16) 98125-8665

     

  • NOVAS NORMAS PARA AQUISIÇÃO DE VEÍCULOS COM ISENÇÃO DE IPVA E ICMS NO ESTADO DE SÃO PAULO

    NOVAS NORMAS PARA AQUISIÇÃO DE VEÍCULOS COM ISENÇÃO DE IPVA E ICMS NO ESTADO DE SÃO PAULO

     

    Sabemos que a venda de veículos com isenção de ICMS e IPVA, para pessoas com algum tipo de necessidade especial, vêm crescendo muito nos últimos anos. Este benefício tem uma finalidade muito clara: auxiliar no campo financeiro aquelas pessoas que possuem algum problema físico ou mental a adquirirem um veículo para sua própria condução ou para quem lhes faça as vezes.

     

    Esta isenção acarreta na visão do Estado um perda de receita que vem crescendo a medida em que mais pessoas passam a fruir do benefício. Por conta disso, o Estado de São Paulo vem realizando uma série de mudanças legislativas.

     

    No final de 2020, houve uma mudança muito combatida relativa à isenção do IPVA, imposto que se paga anualmente pela propriedade de veículo automotor. A Lei Estadual n. 17.293/20, publicada no dia 16 de outubro de 2020, modificou alguns artigos da Lei Estadual n. 13.296/08, dentre eles o inciso III, do artigo 13, estabelecendo que a isenção do IPVA atingirá: “um único veículo, de propriedade de pessoa com deficiência física severa ou profunda que permita a condução de veículo automotor especificamente adaptado e customizado para sua situação individual.”

     

    Agora, no final de 2021, referido artigo foi modificado novamente, passando a ter a seguinte redação: "Artigo 13-A – Fica assegurado o direito à isenção do IPVA para um único veículo de propriedade de pessoa portadora de transtorno do espectro do autismo em grau moderado, grave ou gravíssimo, ou com deficiência física, sensorial, intelectual ou mental, moderada, grave ou gravíssima, ou de seu representante legal, na forma e nas condições estabelecidas pelo Poder Executivo”.

     

    Vemos que o artigo foi modificado, não mais constando a necessidade da existência de uma adaptação. De outro lado foi inserida a necessidade de uma avaliação biopsicossocial (§ 1º – A concessão do direito de que trata o "caput" deste artigo fica condicionada à comprovação do grau moderado, grave ou gravíssimo de deficiência ou de transtorno do espectro do autismo, aferido em avaliação biopsicossocial…). Com isso, provavelmente, teremos novos entraves para o reconhecimento da isenção.

     

    Um outro ponto sobre a nova Lei Estadual é que a isenção do IPVA permanece atrelada ao quanto estipulado para o ICMS, ou seja, atualmente o que está previsto no Convênio 204/21 que estabelece a isenção do ICMS nos seguintes termos: "§ 9º Ao veículo automotor novo, cujo preço de venda ao consumidor sugerido pelo fabricante for superior ao valor de que trata o § 2º desta cláusula, desde que este preço sugerido não ultrapasse a R$ 100.000,00 (cem mil reais), incluídos os tributos incidentes, poderá ser aplicada a isenção parcial do ICMS, limitada à parcela da operação no valor de R$ 70.000,00 (setenta mil reais).

     

    Ou seja: a) veículos de valor até 70 mil teriam isenção total de IPVA e ICMS; veículos de valor entre 70 mil e 100 mil teriam que pagar o IPVA e ICMS proporcionalmente sobre o que exceder os 70 mil e c) veículos de valor acima de 100 mil não teriam isenção.

     

    Fato é que a Lei Estadual paulista ainda não foi regulamentada e, por isso, muitas pessoas que novamente fariam jus às isenções, especialmente no que tange ao IPVA – de cobrança anual – tiveram o imposto lançado e não sabem como agir. Há uma promessa da Secretaria da Fazenda de corrigir o sistema tão logo haja a regulamentação da lei, mas o problema é este mês já estão vencendo as datas para o pagamento do IPVA com desconto.

     

    Tal fato gera grande insegurança aos contribuintes e pode impulsionar o ajuizamento de ações judiciais que poderiam ser evitadas.

     

    Jorge Sylvio Marquezi Junior

  • LEI COMPLEMENTAR N. 190/22 – COBRANÇA DO DIFAL DO ICMS NAS OPERAÇÕES INTERESTADUAIS COM CONSUMIDORES FINAIS NÃO CONTRIBUINTES

    LEI COMPLEMENTAR N. 190/22 – COBRANÇA DO DIFAL DO ICMS NAS OPERAÇÕES INTERESTADUAIS COM CONSUMIDORES FINAIS NÃO CONTRIBUINTES

    Foi publicada no último dia 05 de janeiro a Lei Complementar n. 190/22 que regulamentou a cobrança do ICMS nas operações e prestações interestaduais destinadas a consumidores finais não contribuintes deste imposto. Referida lei altera as disposições da Lei Complementar 87/96 (Lei Kandir) sobre o tema.

     

    A sanção e promulgação desta nova lei é importante, pois, em fevereiro de 2021 o Supremo Tribunal Federal entendeu, nos julgamentos do recurso extraordinário 1.287.019 e da ADIn 5.469, que é necessária a existência de Lei Complementar para disciplinar a cobrança do diferencial de alíquota do ICMS nas operações de circulação de mercadorias interestaduais, o que até então não existia. A tese fixada foi: “A cobrança da diferença de alíquota alusiva ao ICMS, conforme introduzida pela EC 87/15, pressupõe edição de lei complementar veiculando normas gerais”.

     

    A Emenda 87/15, em linhas gerais, havia determinado que em operações interestaduais quando o comprador do bem ou tomador do serviço não for contribuinte do ICMS, a pessoa vendedora deverá pagar ao Estado de origem a alíquota interestadual (7% ou 12%, conforme o estado) e para o Estado de destino do bem ou serviço a diferença entre sua alíquota interna e a alíquota interestadual (DIFAL).

     

    Vale lembrar que até a promulgação da Lei Complementar 190/22 somente havia no ordenamento a regulamentação da matéria realizada no âmbito do CONFAZ – Convênio ICMS 93/15 -que não seria suficiente para validar a cobrança, mas como houve modulação dos efeitos da decisão do STF para o exercício seguinte ao julgamento, ou seja 2022, os contribuintes tiveram que fazer referido recolhimento do DIFAL para manter a sua regularidade fiscal até o momento.

     

    A sanção e promulgação da Lei Complementar 190/22 é importante para os entes federados, pois com ela se asseguraria o cumprimento das previsões constitucionais sobre o tema, da decisão do Supremo Tribunal Federal e uma conduta que já vem sendo adotada pelos Estados, mas que ficaria sem respaldo normativo a partir de 2022, momento previsto na modulação dos efeitos da decisão.

     

    Sobre o aspecto temporal, vigência da nova lei, é preciso pontuar que poderão existir algumas discussões, pois seu artigo 3º se previu que ela deve entrar “em vigor na data de sua publicação, observado, quanto à produção de efeitos, o disposto na alínea "c" do inciso III do caput do art. 150 da Constituição Federal”, ou seja, somente se respeitaria a anterioridade nonagesimal e não de exercício, o que seria passível de questionamento, notadamente pela majoração da carga tributária, pela inclusão do DIFAL em sua própria base de cálculo (art. 1º, LC 190/2022).

     

    De qualquer forma, mesmo que superada a questão da anterioridade de exercício, como o Supremo decidiu que as normas do Convênio não valem a partir de janeiro de 2022, haverá um período de pelo menos de 90 dias – anterioridade nonagesimal – sem regulamentação vigente.

     

    Com base neste raciocínio, seria possível, no mínimo, defender que o DIFAL do ICMS nas operações interestaduais a consumidores finais que não sejam contribuintes não seria devido no período compreendido entre 5º de janeiro a 5º de abril de 2022.

     

    Mais do que isso, relevando-se a questão temporal acima, será sempre necessário verificar a existência de lei em cada Estado que dê fundamento para referida cobrança, os Estados que ainda não o tenham feito deverão fazê-lo e se deverá, também, respeitar as anterioridades de exercício e nonagesimal, aferidas a partir da edição da lei interna de cada Estado.

     

    Vale lembrar, neste contexto, que os Estados de  MG, SP, PR, RJ e RS, de forma antecipada à LC 190/2022, já internalizaram a cobrança do DIFAL na legislação local, ou seja, sem o suporte de validade (lei complementar) estipulado pelo STF (ADI 5.469 e o Recurso Extraordinário 1.287.019), fato este que pode ser objeto de contestação por parte dos contribuintes, embora haja jurisprudência do STF (Tema 1094) no sentido de considerar “válida” a legislação local, mesmo que anterior à lei complementar federal, mas cujos efeitos, segundo a própria Corte Suprema, seriam materializados somente a contar da vigência da referida lei complementar, isto equivale a dizer que, a legislação estadual produziria efeitos a partir de 05/04/2022.

     

    Enfim, nos termos estipulados pelo STF (ADI 5.469 e o Recurso Extraordinário 1.287.019), a cobrança do DIFAL nas operações interestaduais envolvendo não contribuintes do ICMS está suspensa desde 01/01/2022, sendo possível advogar a tese de que deve permanecer assim até 31/12/2022, tendo em vista a majoração do tributo, pela inclusão do DIFAL em sua própria base de cálculo, a teor do artigo 150, inciso III, letra “c”, da CF/88, afigurando-se ilegal qualquer cobrança dos Estados no exercício de 2022, em que pese a posição já divulgada pelos Estados, por meio do CONFAZ, no sentido de que não houve instituição ou majoração da carga tributária, mas mera “regulamentação” de uma cobrança que já existia, ou seja, um verdadeiro absurdo!

         

    Jorge Marquezi

    jorge.marquezi@brasilsalomao.com.br

     

    Maicow Leão Fernandes

    maicow.fernandes@brasilsalomao.com.br

  • Afinal, vale a pena contribuir para o INSS?

    Afinal, vale a pena contribuir para o INSS?

    Por Fernanda Bonella Mazzei Abreu

     

    O dia 24 de janeiro foi a data escolhida para homenagear àqueles que se dedicaram por longos anos ao trabalho e agora usufruem de merecido descanso. Contudo, embora a aposentadoria seja almejada pela grande maioria da população, muitos ainda questionam se afinal, vale a pena contribuir para o INSS?

     

    Inicialmente, é preciso destacar que, para aqueles profissionais que exercem atividade remunerada, a contribuição para a previdência social é obrigatória, em virtude de previsão legal. Assim, valendo a pena ou não, a contribuição previdenciária deve ser realizada mensalmente.

     

    Sabemos que existem muitos cidadãos que trabalham, mas nunca recolheram contribuição previdenciária. Isto, infelizmente, é comum. Todavia, se o INSS (através da Receita Federal) tomar conhecimento de tal situação, poderá efetuar a cobrança dos valores devidos (respeitado o prazo prescricional).

     

    Mas, afinal, vale a pena contribuir para o INSS? A resposta é sim. Isso porque, além de garantir o recebimento de um benefício previdenciário de aposentadoria (quando cumpridos todos os requisitos legais) em valor nunca inferior ao salário-mínimo (o que não é uma regra para os casos de previdência privada), o segurado tem direito a receber, se for preciso, benefício por incapacidade, independentemente do cumprimento de carência (em casos específicos, como o de acidentes de qualquer natureza).

     

    Ademais, no âmbito do regime geral de previdência social (INSS), o benefício de aposentadoria será pago ao segurado enquanto ele viver, diferentemente do que ocorre no caso da previdência privada. Neste caso, o contratante receberá o valor nela acumulado à vista ou enquanto ainda existir saldo em sua respectiva conta. 

     

    “Portanto, o ideal é ter um planejamento e consultar um profissional da área para sanar dúvidas e obter as orientações adequadas, pois vale a pena contribuir para o INSS. Um bom plano renderá ainda mais resultados se for feito com a antecedência devida. Essa é uma forma de se investir no próprio futuro.”

     

    Fernanda Bonella Mazzei Abreu é advogada e sócia do Escritório Brasil Salomão e Matthes Advocacia, especialista em Direito Previdenciário e Processo Previdenciário e

    Especialista em Direito Tributário

     

  • Universidade de Direito da Espanha publica artigo dos advogados Brasil Salomão e Rodrigo Forcenette

    Universidade de Direito da Espanha publica artigo dos advogados Brasil Salomão e Rodrigo Forcenette

    O Boletim da Associação Internacional de Direito Cooperativo, editado pela revista da Faculdade de Direito da Universidade de Deusto, em Bilbao, na Espanha, publicou em sua edição 59, de dezembro de 2021, o artigo “El acto cooperativo en Brasil y legislación tributaria aplicable”, de autoria dos advogados e sócios da banca, Brasil Salomão e Rodrigo Forcenette. A revista é veiculada em várias universidades da Europa e da América Latina.

    Com versões em espanhol e inglês, o artigo aborda a temática proposta destacando as interpretações que os Tribunais de Justiça brasileiros têm aplicado ao tratamento tributário do ato cooperativo. Em três tópicos, Brasil Salomão e Rodrigo Forcenette apresentam e comentam um resumo da estrutura operacional do sistema legislativo nacional no tocante à seara tributária, falam sobre o cooperativismo no Brasil e sobre o tratamento tributário concedido aos atos praticados pelas cooperativas. O arremate do artigo traz as considerações finais dos autores e disponibiliza a bibliografia referencial.

    Assessor jurídico de cooperativas médicas, Brasil Salomão é fundador e sócio no escritório Brasil Salomão e Matthes Advocacia, pós-graduado em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), membro da Academia Brasileira de Direito Tributário e do Instituto de Direito Tributário da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP).

    Sócio-diretor executivo do escritório e mestre em Direito Tributário pela PUC-SP, Rodrigo Forcenette é especialista na área de Direito Tributário, professor da matéria em cursos de graduação e pós-graduação, autor de diversos trabalhos científicos e coordenador do livro “Direito Tributário cooperativo”.

    Para ter acesso ao artigo acesse: https://baidc.revistas.deusto.es/issue/view/276.

  • SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL RECONHECE REPERCUSSÃO GERAL EM NOVA CONTROVÉRSIA RELACIONADA ÀS CONDENAÇÕES IMPOSTAS À FAZENDA PÚBLICA – TEMA 1170

    SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL RECONHECE REPERCUSSÃO GERAL EM NOVA CONTROVÉRSIA RELACIONADA ÀS CONDENAÇÕES IMPOSTAS À FAZENDA PÚBLICA – TEMA 1170

     

    Conforme noticiado há tempos, o Supremo Tribunal Federal concluiu, em Março/2020, o julgamento do Tema 810, o qual discutia a validade da correção monetária e dos juros moratórios incidentes sobre as condenações de origem não-tributária impostas à Fazenda Pública.

     

    Na ocasião, portanto, foi fixada a tese de que, sobre os débitos da Fazenda Pública, oriundos de origem não-tributária, incidirão juros calculados com o índice de variação da poupança (aplicação da Lei nº 11.960/09) e correção monetária pelo IPCA-E (desde 26/06/2009).

     

    Assim, os processos que se encontravam sobrestados há anos – isto é, parados – voltaram a tramitar normalmente.

     

    Ocorre que, recentemente, em Outubro/2021, o Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal reconheceu a existência de repercussão geral do Tema 1170, no qual se discute nova controvérsia relacionada às condenações impostas à Fazenda Pública, qual seja, a validade dos critérios de juros e correção monetária fixados pela tese firmada no Tema  810, aplicáveis nas condenações de origem não tributária da Fazenda Pública, no entanto, apenas para aqueles processos cuja coisa julgada já havia fixado índice diverso.

     

    Neste cenário, até que o Tema 1170 seja definitivamente julgado pelo Supremo Tribunal Federal, os processos cujo objeto envolvam a discussão supramencionada serão novamente sobrestados, sem prazo determinado para a retomada de sua movimentação.

     

    O nosso escritório está acompanhando a evolução do julgamento do Tema 1170 e seguirá atualizando os nossos clientes. 

     

    Colocamo-nos à disposição de todos os interessados no tema para o esclarecimento de quaisquer dúvidas.

     

    BRASIL SALOMÃO E MATTHES ADVOCACIA

    Área Direito Administrativo

    E-mail: direito.administrativo@brasilsalomao.com.br

     

  • O Decreto nº 10.854 trouxe novo limitador para o gozo do benefício do PAT, violando o princípio da legalidade e a Lei nº 6.321/76

    O Decreto nº 10.854 trouxe novo limitador para o gozo do benefício do PAT, violando o princípio da legalidade e a Lei nº 6.321/76

     

    Como é de conhecimento, para as pessoas jurídicas sujeitas à tributação pela sistemática do lucro real, são permitidas uma série de deduções, como forma de se atingir o real montante tributável.

     

    Uma dessas deduções se refere ao Programa de Alimentação do Trabalhador – PAT, que foi criado pela Lei n. 6.321/1976, com o intuito de melhoria nas condições nutricionais dos trabalhadores.

     

    No dia 10/11/2021, no entanto, o executivo federal editou o Decreto nº 10.854, pelo qual alterou as regras de aproveitamento do PAT previstas no artigo 645 do RIR (Decreto nº 9.580, de 2018).

     

    Referido Decreto alterou a redação do artigo 645 do Regulamento do Imposto de Renda – RIR/2018, acrescendo as seguintes diretrizes

     

    a) Para os casos de concessão de vales/tickets as despesas ficam limitadas a trabalhadores que recebam até 05 (cinco) salários-mínimos;

    b) Para os casos de serviço próprio de refeições ou de distribuição de alimentos por meio de entidades fornecedoras de alimentação coletiva, a dedutibilidade poderá englobar as despesas de todos os trabalhadores;

    c) A dedução da despesa passará a ser limitada ao valor de 01 (um) salário-mínimo por empregado;

     

    De fato, o que ocorre é que o Decreto nº 10.854, sob o pretexto de regulamentar a Lei n. 6.321/76, trouxe novas modificações na forma de apuração do PAT, mais uma vez trazendo limitações inexistentes na lei, em expressa violação ao princípio da legalidade e da hierarquia das leis.

     

    O Superior Tribunal de Justiça, em outras ocasiões, já reconheceu a ilegalidade de decretos limitarem a atuação da lei.

     

    Em relação ao PAT isso ocorreu especificamente quando o art. 1 do Decreto 05/91 limitou a dedução ao IRPJ devido, no valor equivalente a 15% das despesas realizadas a esse título.

     

    Nessa ocasião, o Superior Tribunal de Justiça decidiu reiteradamente em favor dos contribuintes:

     

    “TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. IMPOSTO DE RENDA. PROGRAMA DE ALIMENTAÇÃO DO TRABALHADOR – PAT. ART. 1o. DA LEI 6.321/1976. FORMA DE CÁLCULO. DEDUÇÃO SOBRE O LUCRO TRIBUTÁVEL DA EMPRESA E NÃO SOBRE O IMPOSTO DE RENDA DEVIDO. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.

    1. Os benefícios instituídos pelas Leis 6.297/75 e 6.321/76 aplicam-se ao adicional do Imposto de Renda da seguinte maneira: deduz-se as correspondentes despesas do lucro da empresa, chegando-se ao lucro real, sobre o qual deverá ser calculado o adicional (REsp. 1.754.668/RS, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 11.3.2019).”

     

    Na ocasião, reconheceu-se a ilegalidade do Decreto 05/91, no sentido de que a trava de uso do benefício do PAT (4%) deve ser calculada com base na Lei 6.321/76, também sobre o adicional de 10%.

     

    Outras formas de limitação do incentivo fiscal do PAT também já foram estabelecidas pela Receita Federal, como a edição da Instrução Normativa DPRF nº 16/92, que fixou um valor limite para a dedutibilidade da alimentação fornecida ao trabalhador. Na ocasião o STJ também reconheceu a ilegalidade da limitação.

     

    Tendo em vista, assim, que o Decreto nº 10.854 trouxe novo limitador para o gozo do benefício do PAT, bem como levando-se em consideração o histórico de jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema, vislumbra-se para os contribuintes que se sentirem lesados a possibilidade de discussão da matéria junto ao poder judiciário em face da violação ao princípio da legalidade e da Lei nº 6.321.

     

    Para aqueles contribuintes que decidirem atender aos termos do Decreto nº 10.854, recomenda-se que seja preparado controle apartado demonstrando-se que os limites estabelecidos foram atendidos, quando da dedução do PAT do cálculo do IRPJ.

     

    Thiago Strapasson

    E-mail: thiago.strapasson@brasilsalomao.com.br

     

     

  • A INCONSTITUCIONALIDADE DO DECRETO MUNICIPAL Nº 77/2021, DE RIBEIRÃO PRETO, QUE INSTITUIU A TARIFA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO PÚBLICO DE MANEJO DE RESÍDUOS SÓLIDOS

    A INCONSTITUCIONALIDADE DO DECRETO MUNICIPAL Nº 77/2021, DE RIBEIRÃO PRETO, QUE INSTITUIU A TARIFA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO PÚBLICO DE MANEJO DE RESÍDUOS SÓLIDOS

     

    Tributo é prestação pecuniária, compulsória, prevista em lei, cobrada mediante administrativa vinculada, que não se constitua em sanção por ato ilícito (art. 3º do Código Tributário Nacional), devida ao Estado. Tributo, portanto, decorre de imposição legal. Entre as espécies do gênero tributo, tem-se a taxa; ela decorre de serviço eminentemente público, que só pode ser prestado pelo Estado, desde que a contraprestação seja serviço público específico e divisível, ou então decorrente do exercício regular do poder de polícia.

     

    Há serviços de adesão compulsória, prestados sem concorrência entre o serviço oferecido pelo Estado e fornecido por particular, como recolhimento de lixo, os quais ensejarão cobrança de taxa ainda que os serviços não sejam prestados, mas que estejam potencialmente à disposição do particular;  há aqueles, de não adesão compulsória, como emissão de passaporte, mas que são prestados apenas pelo Estado, devidos em função apenas da realização do serviço.

     

    De toda forma, para exemplificar, serviço de emissão de passaporte, por ser apenas prestado pelo Estado, é remunerado mediante taxa (tributo) – o que, para ser criado, depende de lei. Jamais de ato unilateral do poder executivo.

     

    A Tarifa é igualmente uma prestação pecuniária, devida ao Estado, mas em função de um serviço realizado pelo Estado como se particular fosse, ou, dito de outro modo, em razão de um contrato firmado pelo particular com o Estado. Trata-se de serviço realizado pelo Estado, e contratado pelo particular, que encontra concorrência entre pessoas de direito privado.

     

    Assim, o valor que se paga para emissão de passaporte é taxa (não se pode emitir o passaporte em outro espaço que não na sede a polícia federal, órgão público), eis que o serviço é eminentemente público.

     

    O montante que se paga pelo fornecimento de energia elétrica, ainda que a energia seja fornecida pelo Estado, é tarifa. É que, por mais curioso que possa parecer, o sujeito pode se valer de um gerador próprio de energia; não está obrigado a se ligar à rede pública. Ao usar e pagar pelo uso da área azul, está-se diante de tarifa; por estúpido que possa soar o sujeito poderia ter usado o estacionamento privado. Ao andar de ônibus, serviço público, o valor recolhido tem natureza de tarifa; este mesmo sujeito, por mais caro que possa parecer, poderia escolher ir de táxi. Essas contraprestações, quando remuneradas, o são por tarifas – a contraprestação não é um serviço realizado apenas pelo Estado.

     

    Tributo do tipo taxa, portanto, decorre de imposição legal (valor recolhido para emissão de documento de identidade); já tarifa é valor recolhido em função de um serviço prestado pelo Estado, mas que encontra concorrência no particular (tarifa de ônibus, por hipótese).

     

    O Supremo Tribunal Federal, em julgamento excessivamente didático de relatoria do Ministro Lewandowski, cuidou de diferenciar ambos institutos; transcreve parte do julgamento que confirma o já esboçado:

     

    “A compulsoriedade de um tributo decorre do fato de que é jurídica   irrelevante o elemento volitivo para que a obrigação de pagar se mostre exigível. É o que pensa Geraldo Ataliba, ao assentar que: ‘ o fulcro do critério do discrímen está primeira no modo de nascimento da obrigação. Se se trata de vínculo nascido da vontade das partes, estar-se-á diante de figura convencional (obligatio ex voluntate), mútuo, aluguel, compra e venda etc.. Isto permite discernir a obrigação tributária das obrigações convencionais. Se pelo contrário, o vínculo obrigacional nascer independentemente da vontade das partes – ou até mesmo contra essa vontade – por força da lei, mediante a ocorrência de um fato jurídico lícito, então estar-se-á diante de um tributo, que se define como obrigação jurídica legal, pecuniária que não se constitui em sanção de ato ilícito, em favor de uma pessoa pública (…) Em outras palavras, se a alguém é dado optar por certo comportamento dentre vários outros igualmente possíveis, e estando um ou mais deles liberados do pagamento de determinada obrigação pecuniária, a submissão ao ônus passa a ter caráter voluntário, o que não se coaduna com o conceito de tributo. Se por outro lado, todos os meios legítimos de realização desse mesmo comportamento levarem ao pagamento compulsório da obrigação, o ônus, por não depender da vontade do responsável, apresentará inequívoca natureza tributária”. (RE 576189 – Órgão julgador: Tribunal Pleno – Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI – Julgamento: 22/04/2009 – Publicação: 26/06/2009)

     

    É induvidoso que, então, tributos (do tipo taxa) e tarifas são valores devidos ao Estado: o primeiro em função de contraprestação estatal eminentemente pública, cujo serviço só pode ser prestado pelo Estado[1]; o segundo é devido em função de uma contraprestação estatal mas que pode também ser realizada pelo particular.

     

    A lei nº 11.445/07, de 05 de janeiro de 2007, qual estabelece diretrizes nacionais para o saneamento básico, fixou em seu artigo 29 que os serviços públicos de saneamento básico terão sustentabilidade econômico-financeira assegurada por meio de remuneração pela cobrança dos serviços, entre outros, de resíduos sólidos. Vide artigo 29 da norma:

     

    “Art. 29. Os serviços públicos de saneamento básico terão a  sustentabilidade econômico-financeira assegurada por meio de remuneração pela cobrança dos serviços, e, quando necessário, por outras formas adicionais, como subsídios ou subvenções, vedada a cobrança em duplicidade de custos administrativos ou gerenciais a serem pagos pelo usuário, nos seguintes serviços:          (Redação pela Lei nº 14.026, de 2020)

    I – de abastecimento de água e esgotamento sanitário, na forma de taxas, tarifas e outros preços públicos, que poderão ser estabelecidos para cada um dos serviços ou para ambos, conjuntamente;          (Redação pela Lei nº 14.026, de 2020)

    II – de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos, na forma de taxas, tarifas e outros preços públicos, conforme o regime de prestação do serviço ou das suas atividades; e          (Redação pela Lei nº 14.026, de 2020)

    III – de drenagem e manejo de águas pluviais urbanas, na forma de tributos, inclusive taxas, ou tarifas e outros preços públicos, em conformidade com o regime de prestação do serviço ou das suas atividades.          (Redação pela Lei nº 14.026, de 2020)”. 

                  

    A mesma lei, em seu artigo 35, trata da possibilidade de instituir taxas ou tarifas para prestação de serviço de limpeza urbana ou manejo de resíduos sólidos, o que, interpretando em conjunto com o Código Tributário Nacional, reclama conclusão pela possibilidade de apenas instituir taxa para recolhimento de resíduos sólidos, porque, a rigor, se trata de serviço eminentemente público. O contribuinte não terá escolha senão se utilizar do serviço público.

     

    “Art. 35. As taxas ou as tarifas decorrentes da prestação de serviço de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos considerarão a destinação adequada dos resíduos coletados e o nível de renda da população da área atendida, de forma isolada ou combinada, e poderão, ainda, considerar”.

     

    Dito de outro modo, em nenhum momento a Lei que traz o marco regulatório do saneamento básico fixou que, para remunerar recolhimento de resíduos sólidos, o instituto a ser utilizado para remunerá-lo, no serviço público de resíduos, seria tarifa.

     

    Tratando-se de serviço público, que será prestado pelo Estado, e não tendo possibilidade do contribuinte escolher outro na concorrência, é taxa. Não tarifa.

     

    Aliás, a Lei n.º 11.445/2007, de natureza ordinária, à luz do artigo 146, III, da Constituição Federal[2], qual exige Lei Complementar para definição de tributos, nem poderia estabelecer tipo diferente daquele fixado pelo Código Tributário Nacional (recepcionado como Lei Complementar pelo atual texto constitucional) – ou seja, taxa para remunerar serviço público eminentemente público.

     

    Feita a abordagem teórica inicial, passa-se ao caso concreto.

     

    O Município criou tarifa por Decreto (n.º 277/2021), publicado em 07 de dezembro de 2021, a incidir sobre serviços públicos – que não encontram concorrência na iniciativa privada e só podem ser prestados pelo Estado ou alguém indicado por ele, não havendo escolha do contribuinte – de manejo de resíduos sólidos. Instituiu, assim, em Ribeirão Preto, a tarifa pela prestação de serviço público de manejo de resíduos sólidos:

     

    “Artigo 1º – Fica instituída, no âmbito do Município de Ribeirão Preto, a  tarifa pela prestação do serviço público de manejo de resíduos sólidos urbanos (RSU), prevista na Lei Federal nº 11.445, de 5 de janeiro 2007, atualizada pela Lei Federal nº 14.026 de 15 de julho de 2020, cujo cálculo e cobrança estão estabelecidos neste decreto. Parágrafo Único – O serviço público de manejo de resíduos sólidos urbanos (RSU) compreende as atividades de coleta, transbordo, transporte, triagem para fins de reutilização ou reciclagem, tratamento e destinação final dos resíduos sólidos urbanos”.

     

    Tratando-se de serviço eminentemente público, para o qual não há escolha ao particular, ele tem que se valer do Estado, o valor devido ao mesmo Estado terá natureza de tributo. Jamais, como quis o Município, de tarifa.

     

    Sem discutir o cálculo da cobrança, pautada em fórmula que leva em conta o volume de água faturado e, entre outros, a categoria do usuário, a cobrança, ainda assim, não passa pelo teste de constitucionalidade.

     

    A rigor, não se observou princípio básico de todo e qualquer tributo, o da legalidade – necessidade de lei, consoante artigo 150, I, da Constituição Federal.

     

    “Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao  contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

    I – exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça”.

     

    O valor devido ao Município, pelo manejo de resíduos, porque se trata de serviço eminentemente público, é tributo. Reclamaria edição de lei. O Município editou Decreto, instrumento unilateral, o que é vedado pela Constituição Federal.

     

    Ainda que se admita, por mero exercício de debate, a possibilidade de criar tarifa para remunerar o serviço público de manejo de resíduos, que não pode ser prestado por particular, mesmo assim, a política tarifária dependeria de lei. É o artigo 175 da Constituição Federal:

     

    “Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei,  diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos.

    Parágrafo único. A lei disporá sobre:

    III – política tarifária”.

     

    A política tarifária depende, a rigor, igualmente, de lei. Mesmo que não seja tributo, então, sendo tarifa, é o caso, ainda assim, de criar por lei. Foi instituído, todavia, por Decreto.

     

    É induvidoso, pois: i) o serviço de manejo de resíduos é eminentemente público; ii) deve ser remunerado através do tributo, por ser serviço eminentemente público, taxa; iii) não poderia, por isso mesmo, ser instituído, como fez o Município, por Decreto; iv) dependeria, a rigor, de lei; e, quando menos, v) ainda que admitíssemos possibilidade de remunerar o serviço por tarifa, a política tarifária dependeria de lei. 

                       

    David Borges Isaac

    E-mail: david.isaac@brasilsalomao.com.br

     


    [1] Não se ignora que a contraprestação pode ser também exercício regular do poder de polícia.

    [2] Art. 146. Cabe à lei complementar:

    III – estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:

    a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes;