Em 29/12/2023 foi publicada a Lei 14.789/2023. Trata-se de Diploma resultante da conversão da Medida Provisória nº 1.185/2023 que, dentre outros assuntos como a apuração da base de cálculo do Juros sobre Capital Próprio (JCP), disciplina o controvertido tema da tributação das subvenções de ICMS concedidas pelos Estados da Federação.
Com grande enfoque no ano de 2023, a incidência do IRPJ e CSLL sobre os benefícios fiscais de ICMS foi objeto de julgamento pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema Repetitivo nº 1.182. Nessa via, é importante pontuar as principais mudanças promovidas pela Lei 14.789/2023 bem como os impactos que serão observados pelos contribuintes.
- Tributação das Subvenções
Em contraste com a antiga sistemática advinda do citado Tema Repetitivo nº 1.182, que se pautava na simples exclusão ou não exclusão dos benefícios fiscais de ICMS da base de cálculo do IRPJ e CSLL, a Lei 14.789/2023 prevê uma sistemática de creditamento das subvenções. Para tanto, descreve em seu art. 1º a possibilidade de apuração de crédito fiscal de subvenção para investimento concedida pela da União, Estados, Distrito Federal ou dos Municípios.
Anteriormente, todo e qualquer benefício de ICMS era considerado subvenção para investimento, por força do §4º do art. 30 da Lei 12.973/2014. Com a vigência da Lei 14.789/2023 em análise, o citado art. 30 restou revogado e somente se sujeitará à apuração do crédito fiscal a subvenção para investimento, isto é, aquela recebida para implantar ou expandir empreendimento econômico. A própria Lei, nos incisos I e II do art. 2º, define os termos “implantação” e “expansão”.
Para o gozo do crédito fiscal de subvenção para investimento, a Lei estabelece um processo de habilitação da pessoa jurídica perante a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil. Os requisitos para habilitação estão descritos no art. 4º e podem ser enumerados como: (i) que a pessoa jurídica seja beneficiária de subvenção para investimento concedida por ente federativo; (ii) que o ato concessivo da subvenção seja anterior à implantação ou expansão do empreendimento econômico e, por fim; (iii) que o ato concessivo estabeleça expressamente as condições e as contrapartidas a serem observadas pela pessoa jurídica relativas à implantação ou à expansão do empreendimento econômico.
Outrossim, a apuração do crédito de subvenção deverá ocorrer através da Escrituração Contábil Fiscal (ECF) e decorre do produto entre as receitas de subvenção e a alíquota de 25% relativa ao IRPJ. A ECF deve corresponder à data de reconhecimento das receitas de subvenção (regime de competência).
Doravante, o art. 8º estabelece que somente podem ser computadas para fins de cálculo do crédito fiscal as receitas que sejam relacionadas às despesas de depreciação, amortização ou exaustão ou de locação ou arrendamento de bens de capital – as receitas não podem ultrapassar as despesas – relativas à implantação ou expansão do empreendimento econômico. Por força do §3º, essa hipótese não se aplica no caso de subvenção relacionada a bem não sujeito à depreciação, amortização ou exaustão.
O mesmo artigo ainda estipula que somente podem ser objeto de cálculo do crédito fiscal as receitas que tenham sido computadas na base de cálculo do IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) – importante mencionar que o §4º determina que o computo das receitas de subvenção na base de cálculo do IRPJ e CSLL não ocorrerá em sede de estimativa mensal, mas sim no ajuste anual. Destarte, o §1º, III do referido artigo veda a apuração do crédito sobre incentivos de IRPJ e sobre o valor do próprio crédito fiscal (cálculo por dentro).
Por sua vez, a utilização do crédito fiscal ocorrerá mediante a informação à Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do valor apurado, o qual poderá ser objeto de compensação com débitos vencidos ou vincendos de tributos administrados pelo órgão informado ou ressarcimento em dinheiro. Só haverá a recepção da declaração de compensação ou do pedido de ressarcimento quando as receitas das subvenções que compuseram o cálculo do crédito fiscal forem reconhecidas para fins de tributação.
Destarte, caso haja a homologação do crédito e o mesmo não tenha sido objeto de compensação, a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil procederá o ressarcimento no vigésimo quarto mês subsequente ao reconhecimento da receita de subvenção para fins de tributação.
Lembramos que houve também a revogação do art. 1º, § 3º, X da Lei n. 10.637/2002 e art. 1º, § 3º, IX, da Lei n. 10.833/2003, implicando na tributação de tais incentivos de ICMS (em todas as modalidades) para fins de PIS/COFINS no regime não cumulativo.
Por fim, em razão do já citado panorama controvertido da tributação das subvenções, a Lei 14.789/2023 estabelece transação tributária especial para os débitos, inscritos ou não em dívida ativa, que foram apurados em virtude de o contribuinte não ter registrado as subvenções na reserva de lucros que trata o art. 195-A da Lei das Sociedades Anônimas (Lei 6.404/76).
No caso de créditos tributários que sejam objeto de inscrição em dívida ativa, de ação judicial, de Embargos à Execução Fiscal ou de reclamação ou recurso administrativo, a transação contemplará os processos pendentes de julgamento definitivo até o dia 31 de maio de 2024.
A disciplina concreta da transação será proposta pelo Ministro de Estado da Fazenda e observará o mesmo regime jurídico da transação por adesão no contencioso tributário de relevante e disseminada controvérsia jurídica, prevista na Lei nº 13.988/20, especialmente no que diz às hipóteses de rescisão, prazos de pagamento e não tributação de descontos.
As formas de pagamento contempladas pela transação especial estão contidas no §3º do art. 13. Na hipótese de os créditos contemplados pela transação especial ainda não terem sido lançados, a Lei prevê em seu art. 14 a possibilidade de o contribuinte realizar autorregularização específica. Nesse último caso, as formas de pagamento estão descritas no §4 do art. 14.
Reforçamos as ponderações acima buscam refletir um breve resumo, sendo fundamental, diante da complexidade e novidade, acionar as assessorias jurídicas, até porque, existem pontos controvertidos a fim de evitar a não tributação ou mesmo em razão do gozo do crédito de subvenção. Por exemplo, a não tributação do crédito presumido/outorgado de ICMS para IRPJ / CSSL, bem como PIS/COFINS, entre outras questões.
III. A Instrução Normativa nº 2170, de 29 de dezembro de 2023 e o Processo de Habilitação do Contribuinte Perante a Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil
Receita Federal do Brasil editou a Instrução Normativa nº 2170, de 29 de dezembro de 2023 dispondo sobre a habilitação da pessoa jurídica para gozo do crédito fiscal de subvenção para investimento discriminado na Lei 14.789/2023 acima descrita. Além dos requisitos já estatuídos na mesma, a Instrução Normativa estabelece nuances importantes, como a documentação necessária para instrução do pedido de habilitação, a serem observadas pelos contribuintes que pretendem a apuração do crédito fiscal de subvenção para investimento.
Nesse sentido, o art. 5º define que o meio para habilitação será o e-CAC, devendo o pedido de ser instruído com a cópia do ato concessivo da subvenção editado pelo ente federativo e com os demais documentos que comprovem o cumprimento dos requisitos previstos no art. 4º, que nada mais são que os requisitos da própria Lei 14.789/2023.
Além de tais condições específicas, necessário que a pessoa jurídica já tenha aderido ao Domicílio Tributário Eletrônico (DTE) e que esteja regular quanto aos tributos e contribuições federais. Em eventual indeferimento ou cancelamento da habilitação, a Instrução Normativa prevê possibilidade do exercício de contraditório e ampla defesa pelo contribuinte. Por fim, em virtude do art. 8º, o transcurso de 30 dias contados a partir do pedido de habilitação implica no deferimento tácito da mesma.
- Apuração dos Juros Sobre Capital Próprio (JCP)
Além das mudanças promovidas em relação à tributação das subvenções, a Lei 14.789/2023 modificou o art. 9º da Lei 9.249/95, alterando a apuração dos Juros Sobre Capital Próprio (JCP).
A principal alteração diz respeito a quais valores irão compor da base de cálculo dos JCP. Para melhor elucidação, veja a seguinte tabela que ilustra as mudanças promovidas pela Lei:
Base de Cálculo dos JCP antes da Lei 14.789/2023 |
Base de Cálculo dos JCP após a Lei 14.789/2023 |
I – Capital social |
I – Capital social integralizado |
II – Reservas de capital |
II – Apenas as reservas de capital decorrentes de (a) subscrição de ações que ultrapassar o valor nominal e (b) preço de emissão fixado exclusivamente para formação de reserva de capital |
III – Reservas de lucros |
III – Reservas de lucros, exceto a reserva de incentivo fiscal |
IV – Ações em tesouraria |
IV – Ações em tesouraria |
V – Prejuízos acumulados |
V – Lucros e prejuízos acumulados |
Destarte, a Lei exclui da base de cálculo dos JCP as variações positivas no patrimônio líquido decorrentes de atos societários entre partes dependentes que não envolvam efetivo ingresso de ativos com aumento patrimonial em caráter definitivo. Há, por fim, a inclusão na base de cálculo dos JCP de (a) eventuais lançamentos contábeis redutores efetuados em rubricas de patrimônio líquido quando decorrerem dos mesmos fatos que deram origem a lançamentos contábeis positivos efetuado sob o rol da tabela acima; e (b) valores negativos registrados em conta de ajuste de avaliação patrimonial decorrentes de atos societários entre partes dependentes.