São diversas as pessoas que nos têm contatacdo relativamente à alteração legislativa proposta no início de 2020 pela Assembleia da República Portuguesa, por via de alteração do Orçamento do Estado, no sentido de se restringir a concessão de autorizações de residência para investimento (ARIs ou Golden Visas) fundadas na compra de imóveis de valor igual ou superior a €500.000,00 (quinhhentos mil euros) nos distritos de Lisboa e Porto – mercados que são tidos em alta conta pelos investidores estrangeiros não apenas por sua liquidez natural, mas também pela variedade de vocações que os ativos imobiliários apresentam nessas regiões.
Ao longo das últimas semanas entretanto, num cenário já infelizmente pandêmico, notamos que os contatos não apenas ganharam nova força, mas também, novos contornos, para se tentar perceber o impacto que a quase-paralisia provocada pelo COVID-19 nos mercados, em nível global, poderá ter nos investimentos em curso em Portugal e, também, nos processos migratórios respectivos, especialmente no programa Golden Visa.
Muito embora não tenhamos como antever os acontecimentos futuros, ainda mais em um cenário de tantas incertezas, cremos que os elementos da realidade econômica, e respectivos contornos jurídicos, possam de certa forma funcionar como balizas para algumas reflexões sobre cenários futuros potenciais, especialmente na matéria relativa à restrição da concessão de Golden Visa para investimento imobiliário em Lisboa e Porto.
No cenário pré-COVID-19 e antes mesmo da alteração do Orçamento do Estado, diversos integrantes do setor imobiliário em Portugal, em especial promoteres imobiliários e associações deste sector, já haviam manifestado preocupação com tal restrição, uma vez que potencialmente não surtirá os efeitos que dela são teoricamente esperados. Com efeito, a restrição da concessão de ARIs nos distritos em questão, Lisboa e Porto, teria por objetivos evitar o branqueamento de capitais e diminuir a especulação imobiliária nos referidos mercados locais. Entretanto, prima facie, parece-nos evitende que uma restrição localizada de investimento e em um determinado setor está longe de ser a melhor e/ou mais eficaz forma de se evitar o branqueamento de capitais. Há que se ter em conta também que os players do sector imobiliário locais, assim como investidores interessados nas respetivas zona indicadas para restrição, certamente deverão encontrar uma forma de, dentro dos limites da legislação que se pretende e com alguma criatividade, criar novas oportunidades para capturar ganhos que os mercados possam oferecer – o que nos leva a crer ainda mais a medida, se implementada, tenderá ao vazio, ou a efeitos quase-nulos, tendentes a zero.
A alteração do Orçamento de Estado criou a possibilidade, faculdade, mas não a obrigação, de se realizar restrição à concessão de vistos gold pela compra de imóveis no valor igual ou superior a €500.000,00 (quinhhentos mil euros) nos distritos de Lisboa e Porto. Trata-se pois de norma de caráter programático, que ainda depende de regulamentação – até agora não editada – para se tornar eficaz e aplicável.
Com o cenário pandémico que estamos a passar e apesar das recentes e ainda incipientes medidas de desconfinamento, é certo que não apenas o mercado passou e esta a passa por um arrefecimento natural, proveniente da queda da demanda, trazendo à discussão a real necessidade das medidas restritivas que antes se buscava implementar.
E, nesse sentido, localmente, já se tem notícias de Lisboa estar a se declarar amiga do investimento, ao mesmo tempo em que a S&P, em seus estudos recentemente divulgados, projeta uma queda de cerca de 2,5% no preço dos imóveis residenciais em Portugal em 2020 de forma geral, com uma previsão de recuperação de 1,1% já em 2021. Isso sem contar a indicação de reapreciação total em 2022, com potencial de crescrimento de 5% a 6%. De olho nessa perspectivas, diariamente vê-se novas divulgações de empreendimentos imobiliários em Portugal, considerando especialmente os mercados de Lisboa e Porto (locais onde acredita-se que a depreciação acima indicada, ainda que ligeira, possa não ocorrer e os preços sejam efetivamente mantidos inalterados em 2020), não apenas pelas razões que já conhecemos acerca desses mercados, mas também pela resiliência do País em face da pandemia e perspectiva de recuperação. Eis então que a crise, apesar de seus contornos humanitários graves e ainda preocupantes, também acaba por criar oportunidades.
Tal recuperação, não apenas do sector imobiliário, mas também da economia nacional portuguesa como um todo, é diretamente correlacionado com o investimento estrangeiro, de modo que o sector imobiliário – assim como outros, tende a contribuir substancialmente com a geração de renda, emprego, impostos, fluxos comerciais, turismos, serviços, banca, balança comercial positiva, etc., de forma direta e indireta, com um efeito exponencial admirável na economia.
Por isso, queremos crer que o Estado Português devará reavaliar e abster-se, ou, no mínimo, postergar substancialmente, a utilização da autorização legislativa de restrição de vistos gold imobiliários em Lisboa e Porto.
Para todos os investidores que pretendam adquirir imóveis em Portugal, para a aplicação ao programa de vistos gold ou não, pensa-se que não existam motivos para não o fazer; ao contrário, há quem acredite que a oportunidade da crise está logo aí, à porta, e será aproveitada por quem estiver pronto, preparado.
* O presente texto “Restrição de Golden Visa em Lisboa e Porto: – faz sentido no cenário pós-COVID-19?” foi elaborado por Fernando Dizero Senise (fernando.senise@brasilsalomao.com.br) e Alexandre Pavanelli Capoletti (alexandre.capoletti@brasilsalomao.com.br), advogados no Basil e em Portugal, integrantes de Brasil Salomão e Matthes – Sociedade de Advogado, SP, RL (www.brasilsalomao.com.br), em colaboração com Global Trust, e tem o intuito exclusive de apresentar reflexões sobre o tema, em caráter opinativo, e não se configura como orientação jurídica ou de investimento.