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Marco Legal das startups e investidor-anjo

03/31/22

Como bem se sabe, as startups têm como marca seu caráter disruptivo, seja no modelo de negócios sob o qual opera, seja no próprio produto ou serviço que oferta, ganhando importante espaço no mercado nacional nos últimos anos, atingindo o número de 13.890 empresas em fevereiro de 2022[1].

 

No entanto, logo em sua concepção, as startups enfrentam graves dificuldades de captação de recursos e de adequação a um mercado ainda apegado a conformações tradicionais, haja vista o receito de investidores por eventual responsabilização, em caso de insucesso, para além do capital investido.

 

É nesse cenário que se fez necessária uma abordagem legislativa mais especializada e flexível, trazida, em muito, pela Lei Complementar 182/2021, popularmente conhecida como Marco Legal das Startups. Sua previsão de um sandbox regulatório – isto é, a possibilidade dessas empresas encaixarem-se, por meio de flexibilizações, em regramentos mais específicos perante, por exemplo a CVM e o Banco Central – marca bem esse novo tratamento da Lei, o qual se estende às formas de captação de investimentos, notadamente a dos investidores-anjo.

 

Já em seu artigo 2º, inciso I, o Marco Legal traz uma definição importante quanto à natureza do capital aportado pelo investidor-anjo: o valor desse investimento não integra o capital social da empresa, de modo que, ao menos em um primeiro momento, o investidor-anjo não é sócio da empresa, sendo desprovido de qualquer poder diretivo ou responsabilização creditória. Essa modalidade de investimento, portanto, diferentemente de outras como o mútuo conversível, não faz do investidor um sócio.

 

As implicações disso vêm reforçadas no artigo 8º e dizem respeito a um fator de grande insegurança para empreendedores que investem em negócios cujo alto potencial de retorno convive com elevados riscos, visando beneficiarem-se de futuros retornos financeiros: a possibilidade de responder por passivos contraídos pela empresa em eventual desconsideração da personalidade jurídica. Postula o referido artigo:

 

“Art. 8º: O investidor que realizar o aporte de capital a que se refere o art. 5º desta Lei Complementar:

(…)

 

II – não responderá por qualquer dívida da empresa, inclusive em recuperação judicial, e a ele não se estenderá o disposto no art. 50 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), no art. 855-A da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, nos arts. 124, 134 e 135 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional), e em outras disposições atinentes à desconsideração da personalidade jurídica existentes na legislação vigente”

 

Dessa forma, afasta-se do investidor-anjo convencional a responsabilização por eventuais débitos da startup por meio do instituto da personalidade jurídica, seja pela teoria contemplada no Código Civil e no CTN, seja pela adotada na CLT e Código do Consumidor, reduzindo-se em boa medida o risco patrimonial do investidor.

 

Vale ressaltar, porém, que as implicações positivas dessa regulação limitam também o poder de atuação do investidor-anjo. Ao mesmo tempo que resguarda o investidor, ao não o elevar à condição de sócio, impede que realize qualquer ingerência ou goze de certo poder diretivo dentro da empresa. Notadamente, investidores-anjo possuem um papel de mentoria dentro das startups em que investem – o que se convencionou chamar de smart money -, oferecendo, além de capital, know-how e redes de relacionamentos. Com a atual definição, essa mentoria fica restrita ao que de fato indica a palavra: conselhos de alguém mais experiente e especializado, sem qualquer força vinculativa.

 

O Marco Legal implementou diversas mudanças positivas para o Novo Mercado, mas não veio desacompanhado de críticas. Alguns especialistas acreditam que houve certa “timidez” nas medidas regulamentadas, como por exemplo a ausência de tributação diferenciada para os investidores. Não obstante, a legislação corrente de fato trouxe maior segurança para o investimento-anjo, o que é um vislumbre de fomento a esse mercado promissor e cada vez menos incerto.

 

[1] https://startupbase.com.br/home/stats

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